Pecados sublimados

Pecados sublimados

Quis eu um dia, ainda bem jovem e insolente, ousar prever o Futuro

Em outras eras, locupletado de mágoas, quis ultrapassar o Passado

Nem uma coisa nem outra logrei: entre os dois, como um intransponível muro

Ergueu-se a barreira do presente, a lembrar-me do fardo a ser transportado.

Ah! Que inveja me dá! Daqueles antigos profetas, santos incompreendidos,

A vagar desgrenhados, alucinados, em desertos a caça de Deus, de outros amores esquecidos

Reencarnados em homens absortos, em solitário velar de seus mortos, a ouvir do mar o bramido.

No fundo do rio eu repouso cercado de paz e silêncio, reencontrando meu painel de eventos, retornando ao útero perdido.

Não sei mesmo responder quem eu sou. Perguntas a esse respeito não faço; talvez excesso de zelo ou pruridos de respeitoso temor.

Ou, quem sabe, me perceba fragmentário, inconstante; quisera mesmo era ser um carbonário, a me bater por uma causa com ardor,

Não oscilar perigosamente entre o cinismo e um aparente senso libertário, lustrosas fachadas em faces-vitrines privadas de valor.

Vasculho sobejos neste labirinto que muitos chamam de Vida, outros, teatro absurdo, em que marionetes encenam sua dor.

Ah! Mas que paz eu teria, se conseguisse atrelar-me a uma carroça grávida de fé, soterrar-me em montanhas de hipocrisia

E mofar nas soleiras das portas, esperando pacato quando a Morte vier. De qualquer forma ela vem, ou cansados da farra a mandamos buscar.

Melhor não fazer melodrama, se existe céu nada sei, a mim não convém escutar, conheço o paraíso na Terra - são três segundos sem par,

Segundos preciosos, infinitos, entrelaçados, contritos, preces prá se recitar, momentos chaves da vida – pecados sublimados em poesia.

Quando acordo, pela manhã, e me ponho a questionar sobre a validade da existência que levo, sei que é hora de sentar e escrever, dar vazão a torrente de angústia que busca escoamento de dentro de mim. Não consigo explicação fácil para as questões que me atormentam e, mesmo que conseguisse alguma, logo me poria a questioná-la também. Então, resolvo que é hora de dar ludicidade aos meus conflitos existênciais – busco amparo em outros homens de diferentes modos de pensar, e acabo por desaguar numa foz de poesia.

Vale do Paraíba, manhã da primeira Segunda-Feira de Dezembro de 2009

João Bosco (Aprendiz de poeta)

Aprendiz de Poeta
Enviado por Aprendiz de Poeta em 08/12/2009
Reeditado em 24/06/2020
Código do texto: T1966837
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