Junto à Bandeira
Uma palavra pode lhe fazer recordar,
uma palavra pode lhe fazer pensar
mais alto, mas ainda preso ao chão.
Não posso lhe pedir para sorrir:
será mais construtivo agora encarar sua mente
do seu úmido ponto de vista.
Não posso lhe pedir para não chorar.
Não poder mandar embora isso em volta
é algo demais pesado para você carregar...
Ah! deixe-me carregar tudo por você, para você;
ah! deixe-me agora mesmo
carregar tudo para longe!
ou fugir com você, voando,
aos bufonescos acordes...
Agora só eu posso saber que você chora,
parado, estático, junto à Bandeira.
Só eu posso saber
que a lágrima que cai, assim tão discreta,
está longe demais de mim.
Ao invés de um berro que exulte
as elegias que revolvem seu intimo,
apenas um murmúrio de lábios trêmulos,
numa automática sincronia cadenciada...
Eternidade em minutos.
Há meses, as flores;
há dias, de repentino varreu-se
o esboço de uma ambígua credulidade.
Tão simples era o desejo, porém,
assim abstraído, distante, torna-se vã quimera
ou instantes de devaneio pedante
que, se pudessem agora voltar, neste exato instante,
apenas fariam com que se arrebatasse
o sopro de vida de um ser vivente,
na forma de um arrependimento auto-questionador
que brilha e timidamente escorre...
Agora só eu posso saber que você chora,
parado, estático, junto à Bandeira.
Só eu posso saber
que a lágrima que cai, assim tão discreta,
está longe demais de mim
e faz-se de simples, de nada
– invisibilidade, para os vultos ao redor.
Como é doce e tentador fazer-se de algo,
fazer-se não-feito;
talvez a si próprio fazer desfeito,
desligar-se do momento
e da momentaneamente traidora compreensão...
Amargo é retornar em meio ao fel que persiste
e tristemente constatar que ele é um tudo,
cercando-o em olhares anuviados
de entidades auto-convenientes,
hilariantes, assim falantes, pensantes;
medíocres no falar,
medíocres no pensar e
agora só eu posso saber que você chora,
parado, estático, junto à Bandeira.
Só eu posso saber
que a lágrima que cai, assim tão discreta,
está longe demais de mim.
Ah, quem me dera poder abraçá-lo,
quem me dera poder envolvê-lo
e dizer-lhe que há uma luz!
Dizer-lhe-ia: eis aqui sua defesa,
seu advogado, sua testemunha, seu amanhã!
Feche os olhos, transforme-se em você!
Passagem lhe trarei, passaporte, o quê mais;
só viva o que vive, nunca o que morre
em sua pobre consciência, pesada sobre os pés,
e no entanto tornando-se digna de constar
num arquivo translúcido, aquoso, minúsculo,
que lhe desce pela face
e lhe some no pescoço.
Delicado, etéreo, imperceptível.
Se eu pudesse...
Agora só eu posso saber que você chora,
parado, estático, junto à Bandeira.
Só eu posso saber
que a lágrima que cai, assim tão discreta,
está longe demais de mim.