cantiga

chega uma febre como chega o verão. ardente. teu corpo suado eu me lembro bem. tua pele. quente. era inverno e fazia o calor do teu corpo em mim. tua pele. tua pele e todos os gostos. os janeiros seriam pouco pra guardar. o que me traz. os ventos todos e teu sorriso, meio assim, meio de lado, sorriso pouco. não estavas lá, mas teu corpo, apenas. e o que eu queria? eu não sabia. até hoje não sei, mas eu era o que era lá. isso que espera, que um dia se cansa e ainda assim. e se quiseres, e se me querias, eu estaria lá. pra guardar teu sono, te olhar nos olhos, abraçar tua pele e teu sorriso pouco. e o que é pouco sempre mingua. feito o ócio, o cansaço barato e tênue. e agora restaram outros braços, outros corpos que também são só corpos. e por que não o teu então? outras mãos a me refazer, anestesias e delírios, só pra esquecer esta estação que é toda recordação de ti. andanças e tropeços, me arremesso em outros mundos e amaldiçoo aquelas horas em que teus braços e meus braços foram um. e que tua cor foi minha cor. e que o profundo que eras por vezes vinha pra superfície a embeber-se, a dar-se a provar. e eu provava. todos os gostos teus. teu grito e teu prazer. tua dor e tua solidão. e o silẽncio que habitava esse deserto que és. e que não se dá. não se mostra. e não é mais a hora de se fazer perguntas. fez-se o silêncio e não mais se nota. porque o silêncio é a solidão de um. o desconforto ou a sutileza do que é só e se sabe, se tem a si mesmo. um rio a fluir de braços e peles em vão. a pressa que guarda a si o segredo da angústia. e das canções todas o que eu faço? as flores e os ventos? agora faz tanto frio. faz tanto frio.

Dani Santos
Enviado por Dani Santos em 03/07/2009
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