conhecimento

essas palavras a se espalharem

como areia no deserto

como vento sobre o mar

essas palavras recheadas de entonações,

de fonética,

e semântica

incrustaram na alma

pequenos sulcos

aonde germinaram sentimentos,

devaneios,

esquecimentos.

essas palavras,

seus gestos,

olhos oblíquos a procurar o reto infinito

a tristeza solene

de sofrer em silêncio,

sem lágrimas,

sem esgar ou autopiedade.

essas palavras,

todas condensadas

massacradas num papel,

num verso,

num tema,

ou num selo.

Colado numa carta

sem destinatário final.

e afinal, para quem são as mensagens?

são palavras colocadas num papel enfiado

dentro de garrafa vazia, e

jogada ao mar,

jogada ao acaso

e ,ao descaso do destino,

pelo desatino dos náufragos.

chove muito lá fora,

chove fino

linhas e mais linhas de água e,

decepção

e, todas essas palavras

incapazes de expressarem

minha solidão.

o ciclo infindo das palavras,

no torvelinho das dores cotidianas,

das frustrações rotineiras,

passageiras demais,

a lotarem os bancos internos

da decepção e desesperança.

há um saguão ortográfico a espera dos

acentos corretos.

perdi o prumo,

perdi a razão

enlouqueci dentro da gaveta do armário,

aonde deixei guardadas as lembranças.

em meio as fotografias preto-e-branco.

olhos cegos a tatearem a luz e a imagem,

ouvidos mocos a buscarem sofregamente,

o som ou o significado do som

como se fosse uma legenda.

bocas mortas e mudas a titubearem

os dizeres, os scripts dos personagens e,

a fazer pausas sem fim.

a alma vazia,

só repleta de palavras

que ecoam no túnel da ilusão.

lirismo constrito,

romantismo absurdo de um dia de chuva

e, de nuvens cinzentas

como phênix não-renascida.

essas palavras e o ritual

de pensá-las,

de dizê-las,

de declamá-las;

de jamais morrerem mesmo

ante o silêncio.

essas palavras todas

embrulhando a realidade com sons

guturais, nasais,

átonos e tônicos

sílabas metricamente infinitas e

pausadas

a deixarem rastros humanos

no eco do tempo.

essas palavras e

nenhuma palavra.

silêncio e som,

escultura feita de alma e de corpos

que padecem apenas

por conhecê-las.

carne e o osso do conhecimento.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 24/01/2009
Código do texto: T1401609
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