circunstancial

a sólida solidão escorrega

pelos ladrilhos

do banheiro

correm pelos ralos, rasteira

a espreita de um movimento

de vida além do silêncio,

de verdade além da ilusão

a sólida solidão cai contundentemente

dentro de minha alma

e seu estrondo

arranca minha sintonia

e catatônica

cato os caquinhos cristalinos

do que antes fora imagem

e, hoje é ruína...

diante do degrau

o titubeio

a hesitação do passo

a perna trêmula

o movimento corrompido dos músculos

que doem solitários

e solidários com a dor da alma...

meus olhos ardem

com o fogo cruel dos dias

com a miopia contumaz das criaturas

com a brancura inexplicável dessa manhã

a chuva lá fora,

faz de meu banho

um desperdício..

e friagem dos ladrilhos

parece congelar pensamentos mórbidos...

sólida solidão

sórdida

que nos faz inumanos,

que nos coisifica e nos torna

órfãos de nós mesmos,

sem identidade,

sem alento,

sem certeza,

sem a mão amiga

que ampara pelo caminho.

restam os buracos,

restam as ausências,

as interrogações inúteis e retóricas.

perguntas sem respostas

e respostas sem nenhuma pergunta...

resta o fato instintivo de duvidar

da própria solidão.

E, mirar nos ladrilhos essa primavera

contrita e circunstancial.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 30/09/2008
Reeditado em 30/09/2008
Código do texto: T1204829
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