circunstancial
a sólida solidão escorrega
pelos ladrilhos
do banheiro
correm pelos ralos, rasteira
a espreita de um movimento
de vida além do silêncio,
de verdade além da ilusão
a sólida solidão cai contundentemente
dentro de minha alma
e seu estrondo
arranca minha sintonia
e catatônica
cato os caquinhos cristalinos
do que antes fora imagem
e, hoje é ruína...
diante do degrau
o titubeio
a hesitação do passo
a perna trêmula
o movimento corrompido dos músculos
que doem solitários
e solidários com a dor da alma...
meus olhos ardem
com o fogo cruel dos dias
com a miopia contumaz das criaturas
com a brancura inexplicável dessa manhã
a chuva lá fora,
faz de meu banho
um desperdício..
e friagem dos ladrilhos
parece congelar pensamentos mórbidos...
sólida solidão
sórdida
que nos faz inumanos,
que nos coisifica e nos torna
órfãos de nós mesmos,
sem identidade,
sem alento,
sem certeza,
sem a mão amiga
que ampara pelo caminho.
restam os buracos,
restam as ausências,
as interrogações inúteis e retóricas.
perguntas sem respostas
e respostas sem nenhuma pergunta...
resta o fato instintivo de duvidar
da própria solidão.
E, mirar nos ladrilhos essa primavera
contrita e circunstancial.