espera
Crueldades explícitas
Enormes inexplicáveis vazios
Silêncio que é corruptela da palavra
espera
Interminável espera.
Espera-se para nascer
Espera-se para morrer
Espera-se infeliz pela felicidade
Espera-se e, se envelhece
a cada dia
O infinito se encurta
As semânticas ácidas dos desesperançados
Alcançam os velhos
que aguardam serem abrigados por suas tumbas
Religiosidade passiva
Adoração e hemoptise.
Úlceras sangram silenciosas
Lacerando fomes esquecidas
A luva envolve a mão e o gesto
A lágrima envolve a dor e o rosto
A fisionomia envolve o tempo e a estética
Em delicadas dobraduras
Superpostas
Expostas
Num ensaio prenuncial da morte.
A reflexão da pele e de olhos turvos.
Crueldades explícitas
Calo indecentemente e boquiaberta
Calo-me
Aos poucos a vida vai limando da alma
a indignação,
o inconformismo
o dinamismo patológico
De quem não aceita.
Não aceita, mas vivencia tanto
quanto ao pôr-do-sol.
Morre a humanidade a cada dia,
Num extermínio exótico, ritualístico
com a conivência plácida dos omissos,
com a cegueira dos distraídos
com a conveniência dos políticos.
Eu aqui a espera da espera
aguardando a arte de guardar
o intangível.