sombra do aceno
há um deserto dentro de mim
construído de areia branca finíssima
que quando piso, engolem meus pés,
solapam minhas raízes
e faz com que ande a esmo
nesse deserto não há oásis
há linha do horizonte infinita,
não há canto dos pássaros,
há um silêncio medonho
repleto de mensagens secretas
há um sol escaldente que arde aos olhos,
que arde na pele
e queima a esperança de fugir
vislumbro distante uma saída,
um túnel sem luz,
um diapasão a marcar o compasso
e, cada ida binária
sobra descompassado
meu coração
estranho coração
que ama o deserto e a quietude,
que ama o possível e o palpável,
e fica a beira do abismo
entorpecido,
hipnotizado.
por que todo abismo gira?
cirandeia flashes, imagens, sons e
sensações esquecidas
amarelecidas num papel qualquer
no verso do seu bilhete dizia:
para ser feliz.
seria uma heresia, se tudo não fosse
tudo mentira ou
apenas manobra de discurso.
suas palavras, seus gestos e
até sua voz
me enjoam mortalmente
e, ao vomitar tanta semântica
descubro um meio de puficar a dor
de ter se enganado
sozinha,
ao caminhar pelo deserto
ao escolher o caminho errado
sem deixar rastro,
gratidões
ou pelo menos boas lembranças.
Não sobrou nada,
nem cinzas, nem fogo e
a sombra do aceno de adeus.