REFLEXO
Olhei para mim esta manhã,
de verdade, como há muito não fazia.
O espelho me devolveu um rosto moldado pelo tempo,
com marcas que não pedi,
mas que a vida esculpiu sem hesitar.
O olhar ainda era o mesmo,
sereno, indagador,
como se esperasse respostas
que nunca chegam.
Os traços familiares,
a boca que tanto sorriu,
o cabelo que permaneceu fiel ao seu curso,
e, no entanto, algo ali parecia distante,
como se o reflexo fosse apenas um disfarce
para o que eu não queria ver.
Ao me afastar do espelho,
sentei-me na cama e encarei o invisível.
Dentro de mim, o tempo se escondia,
intocado, imóvel,
abrigando desejos antigos,
defeitos expostos,
frustrações silenciosas.
Sou um homem inacabado,
prisioneiro de máscaras
que sustento sem perceber.
O corpo segue adiante,
mas o espírito hesita,
preso a ilusões frágeis.
Antes que o exterior se desfaça em pó,
preciso vencer a batalha interior,
despir as sombras,
reconhecer-me,
renascer.
Tião Neiva