DO SER HUMANO

O homem, de todos os animais na Terra,

é o que em si as maiores ironias encerra.

Do menor ao maior, do feio ao mais belo,

se observados todos com a mais dura crueza,

não há de encontrar-se em toda a natureza,

um só que tenha causado mais dor e flagelo.

Verdade que há os que se esbaldam em bondade;

que acham ter por missão praticar caridade.

Mas, se o homem tem mesmo um sopro divino,

me perdoe, ó Deus, tua obra é imperfeita!

Há gente que nem o diabo no inferno aceita:

com pele de cordeiro que esconde lobo ferino.

Vemos cá uma mãe, em suas mãos um terço,

orando pelo seu filho adormecido no berço.

Não há quem não se emocione e se enleve.

Adiante, se entrega uma megera ao capricho

de lançar seu rebento indefeso ao lixo.

Aceitar este fato, quem é que se atreve?

Num belo discurso as virtudes que prega

o ser humano, adiante, em seus atos renega

sem pestanejar, entendendo ser normal.

Desdiz o que disse, dissimula e mente.

Só o seu próprio bem é que o deixa contente.

Pensa ser o umbigo do mundo, ser imortal.

Talvez se conteste muito do que foi dito,

mas quão poucos socorrem o pobre e aflito!

Os gananciosos, por seu lado, não vacilam

– em seu intuito de alcançar fama e riqueza –

de fazer uso de todo tipo de torpeza,

indiferentes aos que destroem e aniquilam.

Ainda que atinjas os noventa ou cem anos,

não hás de conhecer por inteiro os humanos!

Talvez o que contigo reincidiu no erro

– e não o que pensastes ter sido sempre correto –

é o que, ao apagar das luzes, te dê algum afeto

chorando sincera lágrima em teu enterro.

Roberto Curt Dopheide