Falta
Falta em mim o freio do comboio.
Anteceder a alma ao espírito,
viajar ao extremo íntimo do ser,
ceifar as minhas asas
e cair diretamente à gênese
da existência.
Falta dissecar a minha sombra.
Ritualizar suas entranhas,
conhecer os mistérios
mais claros, e nunca mais orar
ao ressentimento de sangue:
a ímpia consciência.
Falta sepultar destroços do ego.
Conhecer-se para a morte;
cada fragmento é expurgo
do exagero, da carência,
do lamento que torna vulto
a carne desenfreada.
Travo batalhas reprimidas.
Lágrimas de mármores partem,
do horizonte a chuva cai;
tenho no meu coração
a dor de espasmos duros
que o lume da Lua ausenta.