DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA - RÉQUIEM

1.444 --- 1.868 --- 2.024

(RÉQUIEM)

O horror! O horror! O horror dos desgraçados!

Como facas ao sol, asas brilhantes

pousaram sobre as costas de um gigante

lhe tomando de assalto o seu legado.

Na gávea, a cruz anuncia a sorte:

argolas e grilhões, a férrea morte.

Escravizam-se vidas libertadas

para “libertar almas condenadas”.

Choros e preces vãs, ecos na noite.

A infâmia, o fel e a dor. Cruel açoite!

O horror! O horror! O horror dos desgraçados!

Lágrimas - do Cassanje até o Algarve

em hastas de almas pretas! Tempestade,

inda no mar de pó, a pé singrado.

Por quê? Por Deus, por que nada fizeste? E ao

pélago de Colombo, ainda trouxeste

mais lágrimas de rostos em martírio,

salgando o oceano e seus trilhos

- tumbas de negros corpos açoitados -

ao léu e só com a morte libertados.

O horror! O horror! O horror dos desgraçados!

Numa manhã de agosto – negras flores

emergindo de brigues voadores;

Dos seus porões escuros, e encadeados,

ecoa uma sinfonia de dor e medo.

Tirados de sua pátria ao seu desterro;

rostos banhados, lágrimas infindas

gemidos dolorosos, fim da vida...

Os filhos de Canaã, amaldiçoados

pela insensatez - o único pecado.

O horror! O horror! O horror dos desgraçados!

Reis e filhos de reis, erês e bravos

guerreiros- filhos teus - escravizados.

Negros dorsos, losangos flagelados

pelo estalo do açoite - atroz abutre. E o

condor e a meretriz de ti se nutrem

- do pranto e da dor da escravidão-.

E o teu brado que ecoa na imensidão

há milênios, em vão, corre o infinito,

sem resposta de Deus para o seu grito!

1.444: Ano onde se registrou formalmente, em livros "contábeis", o desembarque de negros africanos escravizados em solo lusitano, na cidade de Algarve.

1.868: Ano em que Castro Alves escreveu "Navio Negreiro", um dos poemas mais emblemáticos da poesia brasileira, que retrata os horrores da escravidão ao descrever um navio negreiro.

2024: É a atualidade.

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