Deriva
Em dias esquecidos, arrasto noites como sombras
em um céu de cinzas,
no silêncio sem paz, no espaço onde a palavra impecável,
viva ou morta, não chega.
Na abstinência da voz, grito um mundo inteiro,
aproveito o tempo de me perder,
em um saber tecido em miragens,
onde todo destino não é mais que deriva.
Num banho de mar de dentro para fora, deságuo,
atravesso as ondas e o medo.
Danço e rodopio na minha tempestade,
com passos de caos, suaves e lentos.
Na urgência do fôlego,
atônita na tônica do existir,
diante da dissolução do ar e do fogo.
Avalio, alivio, respiro como quem ama,
me levo embora de mim.
Desfaço as camadas da dor,
e, além dela, no desejo de não ser,
ainda que desabrigada, no sopro original, reconheço-me.