Hematoma
Eu li as cartas de Cellie
ainda que estas não fossem a mim endereçadas.
Elas traziam consigo sem máscara,
a excruciante realidade de uma mulher vilipendiada.
Não eram ricas em vocabulário,
Tampouco compostas por argumentos articulados.
Mas expunham o abuso em segredo, o machismo grotesco,
A dor e o medo de um alguém violado.
Seus filhos foram dela arrancados, seu direito à escolha cerceado.
Da própria alma ela juntou os cacos, sem certezas de que haveria um amanhã.
A violência e o trabalho forçado, não eram nada comparados a perder seus pedaços.
Ao ver sem um abraço partir sua irmã.
Mesmo tendo tantas carências,
Alienada e sem referências, ela demonstrou uma essência altruísta
Um desejo alquímico por transcendência
A fez questionar sua própria impotência e o ciclos de origem determinista.
Ao conhecer Shug Avery ela se reconhece,
Descobre seu sorriso e a sua beleza
Mas condicionada condena Sofia
Ao mesmo mal que a fez prisioneira.
O Ativismo nem sempre é bem-visto,
E retribui Sofia com o retrocesso.
Ela tem parte de sua vida roubada,
pela injustiça e o racismo funesto.
Cellie desperta e se reapropria,
de sua vida destino e liberdade
Confrontando quem a acorrentava,
Ao descobrir as cartas Nettie, e revisitar toda a verdade.
Passar pela cor púrpura e não nos darmos conta?
Para mim soa como não meter a colher.
Perpetuando o estigma que os ismos apontam.
De se nascer feia preta pobre e mulher.