O deus em que acredito
O deus em que acredito não vive em dogmas e crenças,
Contudo, vive naqueles instantes de abraços e ausências.
O deus em que acredito não está em templos ou altares,
Mas na brisa suave dos campos e na força dos mares.
O deus em que acredito não é feito de regras morais,
Mas de risos soltos e de almas imperfeitas e normais.
O deus em que acredito está nas cores do entardecer,
No voo dos pássaros e nas noites cheias de lua e viver.
O deus em que acredito não exige dízimos e holocaustos,
Não pede de seus filhos repetidas rezas e orações.
Ele é cada pessoa a quem amparamos e ajudamos,
Ele vive nas pequenas bondades das tuas ações.
O deus em que acredito não julga ou condena,
mas acolhe e ama cada alma falha e pequena.
O deus em que acredito está no silêncio da noite,
Na estrela cadente, no fado sem grilhão nem açoite.
O deus em que acredito não exige a nossa perfeição;
mora no erro, na dúvida, na árvore, no fruto do chão.
O deus em que acredito está na essência da vida,
No sorriso das crianças, na lágrima da chuva vertida.
O deus em que acredito não cria purgatórios e infernos,
Mas vive em cada gesto sincero de amor fraterno.
O deus em que acredito é a força de viver que nos guia,
Na mãe que cuida do filho, na luta cotidiana do dia a dia.
O deus em que creio não busca temor nem adoração,
Ele nunca fez parte do olimpo e nem de trindades.
O deus em que creio jamais criou seitas e cristandades,
Ele quer amor e perdão brotando do nosso coração.
O deus em que acredito não veste mantos sagrados,
não busca oferendas ou rituais litúrgicos apressados.
O deus em que acredito se revela na simplicidade,
No sorriso compartilhado, na alegria da amizade.
O deus em que acredito não se esconde em escrituras,
não se perde em sermões, nem em velhas molduras.
O deus em que acredito está nas mãos sempre estendidas,
Nos afazeres da árdua vida, na família que chora, feliz e unida.
O deus em que acredito não vive em profecias,
Mas no suor do honesto trabalhador, na paz dos dias.
O deus em que acredito não impõe penitências,
Ele floresce dos pomares e dos atos de benevolência.
O deus em que acredito não precisa de anjos e coros,
Nem de cânticos grandiosos, nem de tesouros.
O deus em que acredito está naquela risada amiga,
Nas conversas triviais e na palavra que abriga.
O deus em que acredito não teme ter a incerteza,
Está na coragem, na luta, na dor, em cada flor.
O deus em que creio mora no riacho e na luz do sol,
Nas mãos que criam pontes e semeiam girassol.
O deus em que tanto creio sem nunca precisar ter fé,
Faz brotar a seiva da vida de cada fruto e pé.
Com tal esplendor, deus é esse pássaro cantante
Que anda comigo nos dias chuvosos e radiantes.
O deus em que creio sem nunca precisar ter fé,
Floresce firme bem distante de toda sé.
Nasce no riso infante, no natural nascer,
Vive Deus vibrante no amar e no simples viver.
(Não sei quando publicarei outro texto, pois temo o meu amanhã depois dos exames médicos que recebi hoje.
Espero que o meu Sol não se ponha tão cedo, a morte me apavora, tremo de medo, porque amo demais viver e quero continuar aqui: contemplando o meu sol, as manhãs, como são lindos os pássaros que me despertam todos os dias, e ouvir aquele inconfundível cacarejar das galinhas que meus pais criam, degustar um bom caju ou uma suculenta melancia, escrever o que pensamos e sentimos, ler livros novos, ouvir os risos de nossos familiares, conversar com um amigo, assistir a um bom filme, ir trabalhar, abraçar o nosso cachorrinho que nunca nos trai, regar as flores de que tanto gostamos, contemplar as nuvens do céu e imaginar tantas coisas, tomar uma bela ducha, rir de algo bem prosaico, e as borboletas voando de uma flor à outra. SÃO tantas e tantas coisas incríveis que há para fazermos, sentirmos, pensarmos e vivermos... Como é preciosa e tão frágil esta vida nossa! Por isso que deus, pra mim, está nas coisas singelas e humanas do cotidiano, como o pai que leva o filho à escola, como o gari que limpa as nossas ruas (que seres incríveis), como um pardal que gorjeia no fio elétrico de um poste de iluminação pública, como o vento que afaga as folhas da mangueira do meu vizinho, como a manga que cai na beira da calçada, e as formigas que se nutrem dela, e os cães a urinarem os muros e a latirem para os gatinhos que pulam muros sete vezes mais altos estes lindos felinos. SÃO tantas formas de viver, são tantas formas de vida, é tanta vida que choro de alegria e medo quando penso em tudo isso e meu coração se enche de gratidão por ainda estar fazendo parte dessa plenitude que pouco conheço, mas sinto-a em toda a minha pequena alma de poeta. Não sei se o meu Sol se levantará, bem cedo, amanhã, ao canto do galo e dos vívidos bem-te-vis.)