Meu cais

 

Lembra quando eu tinha um tempo

que vivia me enfiando em minha concha?

Escondendo-me de mim mesma?

Sempre que estava triste, brava,

eu fugia pra dentro da concha...

eu era tão cega que não via

que a fuga para os meus pra dentro

não ajudava a resolver o caos,

mas o espalhava dentro de mim.

 

Era como se uma tempestade

se alojasse dentro do peito

e explodisse em raios e trovões.

Então, depois... vinham os textos

em borbotões, o desespero em escrever...

a ânsia em colocar pra fora os tsunamis,

as ondas gigantescas e intransponíveis

que se jogavam de um lado a outro

de meus pra dentro.

 

E eu achava que só chovia sobre mim...

achava que só comigo o tempo nublava

e as nuvens avançavam em furacões intermináveis.

 

Era tomada por uma crise brutal de sentimentos,

pensamentos extremos e minhas digressões

iam todas na direção de me esconder

em meus próprios subterrâneos.

Buscava fugir de mim mesma...

como se isso fosse possível...

 

Talvez... penso... esse enfurnar-se,

esconder, confinar em si mesma,

era um jeito instintivo de sobreviver ao caos...

sem jogar luz sobre ele...

 

Hoje não me escondo mais,

mas viajo em meus pra dentro.

Sou uma grande navegadora de meus mares...

olho a Rosa dos Ventos, perscruto meus mapas,

confiro minha bússola de mão... e sigo...

vou singrando meus mares...

até encontrar os teus...

em teus pra dentro...

é quando aporto em meu cais...