Identidade
Outro dia eu fui ao banco
Por uma necessidade
De pronto foi exigida
A minha identidade
Eu não tinha documento
No meu surrado bornal
Tirei meu chapéu de palha
E expliquei, afinal:
“Eu já te falo, seu moço,
Tudo o que me identifica:
Sou filho do Seu Pedrinho
Sou neto da Dona Chica
Eu nasci bem lá no campo
No meio da natureza
Sou humilde, iletrado,
Desprovido de riqueza
Acredito no bom Deus
Pois foi quem me deu a vida
Trabalho de sol a sol
Essa é, pois, a minha lida
Sou casado com a Maria
Os filhos já estão criados
E apesar de estarem longe
Eles são muito amados
Não tenho muitos amigos
Pra te falar a verdade
Mas os poucos que possuo
São amigos de verdade
Aprecio a lua cheia
E o cantar da passarada
Amo o sussurro do rio
E o orvalho da madrugada
Poderia falar mais
Porém, com sinceridade
Isso resume, seu moço,
A minha identidade”
O rapaz então me olhou
Bastante desconfiado
E um tanto apressado,
Assim ele exclamou:
“Não poderei atendê-lo.
Infelizmente, lamento.
A identidade que importa
É tão só seu documento”
(…)
Como o mundo é diferente
Pra quem vive na cidade…
Onde um simples papel
Vale mais que a identidade.