A Fadiga dos Dias
Nasci de mãos vazias,
E dia ao morrer as terei vazias,
Pois que tudo que consegui ter
Haverá de ficar
E creio eu,
Que levarei comigo apenas o meu ser
O patrimônio de minha consciência.
E nisto parece residir
Toda a miséria e abundância de sermos.
Pois que entre vida e morte,
Não sei se é possível fazer um balanço.
Pois que vivo não saberei da morte,
Pois que morto desconheço o que serei.
E isto não tem nada da mórbido,
Apenas tento entender um pouco,
Ignorar um algo menos,
Como se isto tivesse algum significado.
Pois que significar parece ser o nosso propósito,
Se que que efetivamente temos um.
Pois que em meio aos encontros e desencontros,
Vezes parece mais simples duvidar,
Pois que se encher de uma espécie de nada,
Ainda que se aconchegue a certo vazio,
Parece mais cômodo do que se fazer cheio de tanto,
Pois o ser parece perturbar a paz do não ser.
E não se trata de crença, fé, teologia ou religião,
Mas apenas um inquirir meramente humano,
Esta perturbação que a vida insiste é constatar.
Vejo tanto, sinto tanto, penso tanto...
E cada vez menos quero, menos anseio,
Pois que parece que a vida ser isto
Uma necessidade de querer intensa,
Para depois aprender a renunciar,
Desapegar de tudo aquilo pelo que se viveu.
E eis que estoico, não tenho tempo para rebelar-me,
Pois aceitar parece ser um ato da maior coragem.
Eis que mergulhado num Todo,
Sou átomo de consciência peregrina,
Estou por aqui, e, no entanto,
Algo em mim me faz sentir-me tão distante.
Não reconheço minha própria face
Me assombro com fagulhas de mim
Fragmentos que se unidos
Talvez não tenham sentido algum.
E então me pergunto:
Por que haveriam de ter?
E querendo ser algo
Me vejo livrando-me de mim
Pois que me perdendo
Esqueço caminhos e a mapas
E nada sendo
Tenho a plena liberdade de ser.
23/09/2023
Gilberto Brandão Marcon