INSÔNIA

INSÔNIA

Vem a noite!

E com ela vão se apagando os meus sentidos.

Fecho os olhos!

O silêncio me invade!

A noite não tem cheiros especiais.

O tato se dilui com o contato com os lençóis.

O gosto é o mesmo de sempre, gosto de nada.

Vem a noite!

E com ela vão se apagando os meus sentidos.

Quando eles se apagam de todo,

eu me encontro comigo!

Todos os meus "eus" se encontram!

Se agridem, se ferem, se amam, se acariciam,

se maldizem e se elogiam.

Quando se apagam os meus sentidos,

há um enorme tumulto dentro de mim.

O Eu que eu queria ser, agride o Eu que eu sou.

Estes dois Eus são tão instáveis,

que não têm nem mesmo uma personalidade definida.

Cada um deles é tantos outros Eus.

O Eu que eu imagino que fui, o Eu que serei,

o que eu julgo que os outros vêm, o Eu dos meus sonhos,

o dos meus ideais mais altos, o das minhas ambições,

o do meu orgulho, o das minhas necessidades.

E tantos outros Eus, que se agridem e se acariciam,

que se odeiam e que se amam.

Quando vem a noite,

e os meus sentidos se apagam

sofro este conflito indizível.

Destes meus amigos, e destes meus inimigos,

deste que me prezam, e deste que me desprezam.

Quando vem a noite eu sofro!

Tenho saudades dos meus sentidos.

Acordo abro os olhos.

Por isto sofro de insônia.

Leio, sonho,

saio para o jardim, para sentir algum cheiro da noite.

Vou até a geladeira, tomo um copo de leite.

Sonho me iludo, me belisco.

Busco no sexo a fuga destes meus conflitos.

Porém a noite prossegue,

impassível, inalterada, mansa e sorrateira.

Vai me envolvendo,

e de novo vai tomando conta de mim.

Vai apagando de novo os meus sentidos.

De novo eu me encontro comigo!

Em meio ao pesadelo deste mercado de peixes dos meus Eus.

De novo me acordo!

Por isto sofro de insônia!

O círculo se repete por toda a noite, até que venha o dia.

O sol e luz me devolvem os meus sentidos.

De novo eu sou salvo, para mais um dia viver como posso,

e como o mundo me deixa.

Entrando sempre em choque

com estes meu Eus!

Que à noite voltam

mais amantes ou mais odiosos.

Vem de novo à noite!

E os meus sentidos se apagam.

Por tudo isto,

a noite me invade de medo.

Tenho medo da noite!

Porque tenho medo de mim.