Tempos iguais (ou piores)

Tempos iguais (ou piores)

Ontem foi quinta

Na sexta de hoje

Quinta e sexta iguais

Misturam-se com outros

Dias

Outras datas, idênticas

De repente setenta

Ainda eram cinco

De repente hoje

Ainda são onze

Porteiras fechadas, gado bom

É gado cercado

Confinamento, é o tratamento

Tínhamos notícias de primeira página:

Uma receita de bolo ou doce de banana.

Fatos jamais.

Hoje voltaram as receitas ou as bundas

Das cantoras, sexo oral no palco

Quanta cultura digna de quadro

Na parede.

O puteiro da Estrela cresceu

Tem poste iluminando o telhado

Tem rádio tocando silêncio

Psiu... silêncio!

Poste mijando no cão.

O segurança cobra ingresso mas,

Tem o porrete de maranduba, ele

É canhoto.

A entrada é cara, sem direito ao

Couver.

De repente setenta ainda eram cinco

De repente agora tenho sessenta mais

Cinco ou não...

De repente vinte, isso de repente até

Dezoito.

Bastardos andam soltos, a realeza está

Cheia de fuligem, minha música preferida

Não toca no rádio

Acabou a energia, o rádio está mudo

O que restou de nós? Além da imaginação.

O resultado do jogo ajuda, deu no poste mas

Não deu não deu no rádio.

Houve um roubo a banco

Houve outro roubo não sei onde

Ladrões em cada esquina e eu

Armado com um estilingue

Minha casa não tem vidraça

Telha de vidro muito menos

Fui olhar de perto o puteiro da Estrela

Tava lotado, putas, usineiros, polícia

Bêbados de toda espécie, até um padre

Também um pastor e um pai de santo

Lugar democrático, pagando bem se entra

Que puteiro caro

De repente caro demais

Hoje talvez seja domingo ou até mesmo

Sábado, num mês qualquer neste

Século vinte ou dezenove

Quase todos iguais

Nem o vinte e um escapa

Andamos em círculo e depois

Para trás, de repente sessenta

Meu pai morreu há décadas

Com ele meus avós, tios, amigos

E também meu cachorro

Parece que foi ontem

Todos em dias ensolarados

Dias ensolarados também são tristes

Ruas vazias igualmente

Bares então, sem igual.

Boca calada e amordaçada diminui

A vida, insignificante homem

Sem cantar, sem rir, sem nada.

Ainda eram cinco

Agora ainda são onze

Jesus Cristo formou doze

Das boas novas.

Sobre milhões, garrotes

Tornozelo virou pulso

Cala boca zebedeu

Porque na sua vida quem manda

Sou eu!