QUERIA SER O LOUCO DA ALDEIA
Um dia, quem sabe…
aprenderei a declamar.
A palavra escrita
como num vômito,
êmese sem volta,
uma vez dita,
já não habita
mais em mim.
Por enquanto
ando falando
para dentro,
de mim para mim
e talvez o eco
toque o mundo.
Pouco converso,
pois vivo
num resguardo
quase eterno.
A vida me espera,
mas não tenho talento
para palcos ou públicos.
Mal chego ao camarim
e nem arisco
a me aproximar
da coxia,
pois a arte cênica
é uma espantosa
quimera.
De quase nada
entendo,
Mas se tivesse
que escolher
um antídoto
para a existência,
escolheria a música.
Porém, fui mordido
pela poesia
e agora transpiro
esse veneno.
Sou desafinado
de nascença
e meu corpo
disritmado
até a alma.
Se escrevo,
é porque
não sei cantar,
e isso
por um instante
me acalma.
(Pintura: “O louco”, de Adelino Ângelo. Poema em homenagem a Ildo Simoes Ramos)