O poeta é lavrador
No árido solo, onde o suor vive perto,
Lavra-se a terra, numa profecia fluente.
O lavraDOR, em seu labor duro e certo,
Semeia sonhos e sementes, alegremente.
As mãos calejadas cantam um choroso canto,
Ardem nas chagas que a rude enxada revela.
O poeta é o cultiva-dor de cada verboso campo,
E ele dissipa a escuridão com a chama de sua vela.
Lavrando a terra, mergulho em segredos
E nas entranhas áridas do solo ancestral.
É preciso arar o mistério da vida sem medo
À procura de si mesmo neste desértico matagal.
No sulco aberto, a alma enfim se desvela,
Segredos do solo se descortinam a mim!
No fio da enxada a dor me olha e se revela,
E nasce uma rima, às vezes boa ou ruim.
Na aridez das planícies interiores,
O suor é tinta, é poesia que flui.
A enxada é a mão que sulca flores
E desenha a paisagem que reluz.
Lavra-se a terra como num ritual sagrado,
Cultivando a vida em meio a tanto desalento.
O agricultor, poeta dos pastos e dos arados,
Em seu capinar escreve o poema a contento.
Nos sulcos abertos, raízes e amor se entrelaçam,
Emaranhados de versos que fertilizam esta terra.
O verbo ventará vozes onde as almas se enlaçam,
E os prantos do poeta brotarão orquídeas nas serras.
Estão revolvidos com amor os campos de uva,
E as mãos cavam e se perdem no barro profundo;
A Palavra segue germinando e caindo como chuva,
E nesta labuta o poeta debulha os grãos do mundo.