Premonição
Não são aleatórias as colinas mutiladas
ou este braço de mar como um perturbador vitral da noite
estrangulada
é o sinal da morte que escurece as águas
e detém sua dialética missão de ser sempre diferente
outra
nada mais respira nesta cidade
nem as palmeiras da necrópole de mármore
nem os inquietos aguapés do rio seco
esperamos o milagre da chuva com a língua partida
tememos nossa morte na seca
irônico fim para os habitantes de um porto.
Para nadar é necessário fé e braços enormes
não se trata de flutuar embora se possa levitar nas águas
a ideia é ir contra a corrente e superar a força
desmedida da natureza
de uma cidade pântano.
Uma mulher avança sobre as águas com a precisão
[de um tubarão
chega ao futuro
ilha
sobe as cachoeiras e retrocede até o porvir
queima sobre as águas
o ato ainda é indescritível
ela se encarregará de escrevê-lo.
O porvir, as colinas mutiladas
nem uma Sumaúma sobrevive
espetáculo sinistro de reconstrução e escombros
os cerros castrados farfalham, os esteiros crescem e a água
sempre a água pronta para nos cobrir com seu esquecimento.
A melancolia alastra o asfalto.