BÍLIS

Quantas fomes percorrem o paladar do mundo...

Soco certeiro no estômago das vontades.

A ambição desmedida, insaciável

Com que as bocas, asquerosamente, humanas

Corrompem umas às outras.

O hálito acre do jejum involuntário

Daqueles que se perdem em seu próprio banquete.

A fartura concedida a quem

Não sabe sequer que sente fome.

Os dentes podres ante a carne dura dos resistentes.

A faca cega na mão trêmula

De quem hesita em matar o desejo.

O horror fétido a escorrer da mesquinha insatisfação.

O longo deserto de quem não semeou a esperança.

A fome de si, de amor, de ser,

De ter, de ter, de ter...

A beleza devorada sem tempero

Pelos olhares vorazes, incompassivos.

Sem contar a sede secular

Pelo sangue fluente

Na triste carcaça que somos

E que nossa civilidade ruminou,

Vomitou doentia, deprimente.