Vertiginosa

Estou tendo um sentimento estranho,

que desencrava a unha infeccionada da carne

inexato, pontiagudo, amargo

projeta-se contra as superfícies da pele

num instante-irracional golpear metálico

atira-me contra a inigualável percepção

da fragilidade dos nervos da terra

bastando-se, derradeiro, o sentir

subconsciente que sabe

mais que a mim

sentir…

em mim…

de ti…

(fim)

Circunda, enlouquece, em transe

cinzenta, evaporante, cálida dos versos

mais líricos trazendo à tona pelo verbo

algumas palavras emperradas que gemo

na garganta inflamada, dolorida do tendão

ao palato

para onde vai? Para onde vou?

fico ou volto?

para onde, para quem?

se a única arma que tenho é a poesia

e com ela mais sou golpeada do que golpeio

e é esse meu problema, não confio em palavras,

elas mentem! Visto que delimitam o que sinto dentro de

alguns traços distantes e opacos

jamais serei poetisa, pois o poeta de verdade não pergunta,

ele crê

Lutei por tanto, sempre fui forte

o telefone não irá tocar! Troque logo aqueles lençóis emaranhados!

abra as janelas para arejar!

agora preciso de colo

Mas que colo? Sempre fui forte, ninguém jamais me viu pedindo colo

eu estaria totalmente fora do personagem e esse é o pior papel a se fazer: ser realidade

Ninguém precisa ver, oras

merda! Mais algumas linhas escritas, queria silêncio

e o copo quebrou-se contra a parede, achei que segurava um retrato

sou o que sinto

sou o que não veem acontecer:

não existo

A chaleira apita

lágrimas se derramam e evaporam com a água

isso indica algo

é tristeza? Café amargo combina com tudo, lógico

sento na cadeira apenas pelo contato,

meu corpo junta-se ao que sinto

e de mim, faz casa e cá estou num canto

receosa, evacuada, pronta para mais uma pintura

mais acabamentos e reformas

evitando a demolição com algumas telhas quebradas

sob os pés fincando os dedos

sempre, sempre a força, cansei dela

quero as linhas da camiseta de alguém grudadas no meu rosto

enquanto confio meus sentimentos, chorando

Busco alento no travesseiro

sinto a textura das paredes,

encaixo os dedos juntos num afago

do couro cabeludo que só eu mesma sei fazer

deixo a calmaria pós-choro entrar,

sinto a corrente, do meu corpo ela não se apodera

gira, se debate, fluindo para sair

jamais presa

Não sei se o sol nasceu, mas amanheci

deixei as linhas enrolarem, não penteei o cabelo,

liguei uma música no mais alto volume

andei de calcinha pela casa, vi a comida embolorar, a pilha de roupas encher

nada faria, passei o dia rindo dos erros

sabia que depois tudo se ajeita e a vida amadurece minhas maçãs

descanso faminta, não quero a colheita alheia

ela não é do meu gosto, difícil, que só tem sabor

com o meu testemunho ocular

Vejo-me pequena, novamente no zero

sou nova, agora essa é a minha maior força:

pender ao chão, nem que seja raramente,

quando os firmamentos

já não dão mais conta do meu tamanho.