Arrumação
acordei com vontade
de jogar tudo fora
juntar os papéis da época
da escola e aqueles sapatos
gastos pelas andanças
andanças de gente que já foi
criança ou algumas vezes ainda
se sente
com alguma desconfiança.
acordei pegando as roupas
que não já saíam das sacolas
há mais que dias, mas anos.
as calcinhas, os lenços, os embrulhos
que já empacotaram produtos
e, hoje, vão se desfazer em entulhos.
peguei os móveis todos.
as gavetas tortas e caídas.
os eletrônicos inutilizados.
deixei a casa vazia
de coisas
mas, continuei achando
que estava faltando
algo para ser jogado fora
apesar de tudo
ter ido embora.
só estava eu.
sentada, inclinada a mim
mesma a me olhar.
cheia de histórias
lembranças, angústias
saudades, escusas
a revirar
naquele lar
infindável
de dentro.
vendo quanta coisa
eu precisaria arrumar.