Reflexo (O Morto)
Que ruas vazias e esburacadas...
Enfeitadas de tudo e cheias de nada...
Pássaros de canto mudo,
Borboletas sem cor.
Morgado é o espaço,
Não importa aonde eu for.
Sol tampado...
Céu Nublado...
Noite silenciosa...
Madrugada gritosa...
Eu hein?!
Que pessoas chatas
De caras pálidas!
E essas flores horrendas,
Todas pisoteadas?!
Casas barrocas e modernas.
Ah! Tudo a mesma merda.
Se colocassem nos tetos crucifixos,
Todas ficariam idênticas a sepulcros desvaídos.
Olha aquela festa morta
Cheias de zumbis?!
Eu daria uma coroa de flores
Para todos que me entregam convites.
Eu sou o arco-íris,
Eles, preto e branco.
Eu sou o certo,
Eles, tortos.
Eu voo.
Eles andam.
Eu sou vivo,
Eles, mortos.
Ah! Não me entendem.
Vocês que não sentem.
Eu sou o único vivo
Deste mundo de aquém.
Por isso que gosto do espelho.
O único verdadeiro.
Mostra-me a verdade.
Sou além da humanidade.
Espera?!
Espelho, espelho meu!
Por que me refletes tão pálido e sem expressão?
Espelho, espelho meu!
Por que no meu nariz tem algodão?
Olhos fechados...
Unhas roxas...
Vestido de terno
Com uma gravata frouxa.
Mãos cruzadas
Que nem num parque aquático.
Mas era pra debaixo da terra
Que eu iria ser levado.
Agora sinto dor ao ver o meu reflexo.
Com a minha lógica, isso não tem nexo.
Agora, os meus olhos sangram lágrimas,
Escorrendo pela minha cara pálida.
Limpou meus olhos e as escamas tirou.
Limpou minha alma, agora vejo onde estou.
As ruas eram cheias,
Aplanadas.
Enfeitadas de tudo.
Era eu que não tinha nada.
Os pássaros têm um canto lindo.
As borboletas são cheias de cor.
É eu que sou morgado,
Não importa aonde eu for.
Sol radiante...
Céu azulante...
Noite linda...
Madrugada rica...
Pessoas vivas
De caras limpas.
Que cheirosas flores.
Pena que eu colecionava odores.
Casas barrocas...
Casas modernas...
Era a minha alma
Que preferia a caverna
Festas alegres
Cheias de vida.
Eles não me convidariam
Pois alma eu não tinha.
Eles são arco-íris.
Eu, preto e branco.
Eles são os certos,
Eu, o torto.
Eles voam.
Eu ando.
Eles são os vivos,
Eu, um morto.