CADA MINUTO QUE MORRE
Vivi toda a exuberância
dos dias de juventude
cheio de gozo e saúde,
amores em abundância,
não calculei a distância
do auge até o meu fim,
hoje extenuado enfim,
percebo que o tempo corre.
Cada minuto que morre,
mata um pedaço de mim.
Sorvi o halo das fãs
em esplendorosas noites,
fiz incontáveis pernoites
em divãs das cortesãs;
eis que em minhas manhãs
alvacentas de marfim,
cheirosas como jasmim,
eterno eclipse percorre.
Cada minuto que morre,
mata um pedaço de mim.
O tempo causou-me estragos,
Esse ditador esquálido!
Para orgias sou inválido,
vivo sedento de afagos,
meus olhos viraram lagos,
minha pele de cetim
está áspera que nem brim,
meu Deus, por que isso ocorre!?
Cada minuto que morre,
mata um pedaço de mim.
O sol da minha existência
já pendeu para o ocaso,
também não está tão raso
meu poço de paciência.
Por minha vã preferência
às noitadas de festim,
até mesmo Querubim
se evoco não me socorre.
Cada minuto que morre,
mata um pedaço de mim.
Contenho a ansiedade
pra não morrer de desgosto,
vejo impressos em meu rosto
sinais de debilidade;
me alimento de saudade,
vivo sem fazer motim,
sei que fui o estopim
desse incêndio que transcorre.
Cada minuto que morre,
mata um pedaço de mim.
Não bebo mais os olores
das flores nas primaveras,
arde em meu peito as crateras
do vulcão dos dissabores,
para alívio dessas dores,
nem um chá de alecrim,
em mesa de botequim
afogo as mágoas em porre.
Cada minuto que morre,
mata um pedaço de mim.
A mais doce melodia
não me traz suavidade,
estou imerso em saudade,
tristeza e melancolia,
voou minha alegria,
emurcheceu meu jardim,
quem hoje me vê assim,
baixa o rosto, o pranto escorre.
Cada minuto que morre,
mata um pedaço de mim.
Cresceram minhas madeixas
ao descambar pro outono,
fugiram volúpia e sono,
surgiram mágoas e queixas,
minhas rimas são endechas
sonorizando o meu fim,
essa sensação ruim
dos meus excessos decorre.
Cada minuto que morre,
mata um pedaço de mim.