Canção outonal do amor e da vida
O dia nasce, triste como a morte,
E eu sou a luz esquecida desse dia
Feito de sombras que nada alumia,
Feito folha desferida à própria sorte.
O dia nasce e morre, como a Morte
Deixada de ser morte e de ser dia,
Jogo final tornado em cinzas frias,
Sou meus sonhos sangrando sinas.
A morte é a nuvem do horizonte distante,
A lúrida promessa lá no céu claro e casto
Que guarda o incognoscível como um deus nefasto,
Segredo e temor armazenados pelo último instante.
A Morte vem e voa, como um albatroz
Estonteado pela liberdade do meio-dia,
Vem e pousa a Morte sempre de forma feroz,
E daquele pássaro cheio de vida findou a voz.
Mas sempre surge a tarde, clara como a vida!
A tarde avança como a proa dos belos navios
Na brancura desta minha paixão enternecida.
Teus últimos beijos, tua voz luminosa e lenitiva...
Teus gestos indigestos, teu sorriso orvalhando brios,
Tantas saudades! Tantas recordações tuas perdidas!
Toco o entardecer e na tua concha escura e apetecida;
Grito teu nome, mas a Morte segue firme como os rios,
E a Tua breve chegada se tornou na mais longa despedida.