Havia um Poema
Havia – sempre houve
Um poema caído da árvore,
Mas não seco como a folha.
Uma palavra esquecida,
Num cantinho qualquer da vida,
Encolhida sob os passos
Da indiferença.
Havia um que passava
No rosto de cada nuvem
Pelo olhar, abandonada...
E um outro, sobre a cerca viva,
Que subia pelo muro
Em ramagens enverdecidas.
Havia um poema escandaloso,
Gritando, no meio da rua,
Mas sendo solenemente ignorado
Atropelado pelos carros
E transeuntes apressados.
Havia um poema a ser recitado,
Pousado, de leve, no bico do pássaro,
Havia um poema resguardado
No peito apertado,
Na dor disfarçada...
Havia um poema imenso,
Preso nas engrenagens do tempo,
Nas curvas fechadas das rugas,
Nas gotas lacrimosas da chuva,
Um poema inesquecível
Do qual ninguém se lembrou,
A aguardar no silêncio...
Havia um poema nos olhos,
Na voz, querendo sair,
Mas ele sempre morria
Na boca entreaberta.
Havia um poema inocente,
Brincando entre as sepulturas,
A ignorar, tranquilo,
Nossa sina incerta.
Hoje olhei, e não o vi,
Foi grande a dor que senti...
Um poema nunca espera,
Ele se vai, com o vento,
Escurece
Ao raiar do dia,
A esperar por uma prece
Aos pés da primavera.