Rosto da saudade
Rosto da saudade
eu que abandonei a saudade à sua sorte
que deixei de chorar a ressaca do corpo
envolto em teias ardilosas da vida
preso a tudo, a nada, que não sabia…
conservam-se redes, sentado em bancos de zinco
não há pesca no canal, ou peixe a morder o anzol
embarcam num estalar de dedos, sem promessas
apenas um sorriso e sexo, ou outra coisa qualquer
há na força de amar uma esperança…
ténue, que o futuro seja amanhã
independentemente da saudade ou da força
mas que seja, que seja de verdade
há frutos a cair de maduros
não há quem os apanhe
tantos morrem de fome
por esperarem serem escolhidos
e outros cobiçando o fruto errado…
há no rosto da saudade uma esperança
uma ressaca do corpo
um silêncio por quebrar
um choro calado…
“…”
- enches mais um copo
deixas um cigarro sozinho a fumegar
ouves o tempo, passar, devagar…
o ruído do sol a nascer incomoda…
tudo é… regresso, chegada, e solta-se na ramagem a brisa
um abraço sentido, uma despedida…
e tudo está certo, porque assim tem de ser
sem mudanças, as mudanças doem…
fazem sofrer, e pintas o rosto de saudade…
foges… porque na fuga vives
e ficar é morrer…
Alberto Cuddel
12/07/2020
05:21
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