Ouroboros
Fui bem fundo em tudo aquilo que fiz:
Tive uma bomba e uma flor escolhi.
Vi o mundo bem debaixo do nariz:
Li Sartre, decodifiquei Dali,
atravessei bonança e tempestade;
confrontei o mapa com a realidade
e ainda continuo como um aprendiz,
na busca incessante da verdade...
Sempre fui leve e solto no mundo!
Jamais acreditei em corolários
e apaguei o meu quadro de giz.
Tive um relógio e um calendário;
se fui convidado, perdoaram o atraso;
se me perdi no tempo foi por acaso,
devo ter sido, quem sabe, um templário;
não conheço ira, inveja ou descaso.
Decidir entre o mapa e a realidade
é o grande dilema à disposição.
A matrix gera toda a humanidade:
gênese, apocalipse e o teorema.
Se a dúvida ressuscita a verdade,
após o saber vem a premente indagação
que contém todo o mistério da vida:
quem decide é o coração ou a mente?
"Decifra-me por completo ou te devoro"
- a voz ressoa em nosso sonho de chumbo...
e lembramos dela apenas na fralda.
Depois da redenção debela-se o choro,
Como a criança com um novo brinquedo
Erramos de novo pra nunca aprender...
Tudo fica igual quando se conhece o fundo.
E a redundância tem um papel magistral.
Nada demais, nada mais do que eu já sei,
Sem nenhuma pitada de sarcasmo afinal.
A serpente engolindo a própria cauda,
Soa como a força de um pleonasmo,
da sepultura ao ovo, da flor à semente,
num loop bem tracionado pelo replay,
faz tudo novamente (e de novo) acontecer!
Do livro "Versos Inquietos /Na aba da Lua" Scortecci, 2015