ADESTRAMENTO

O despertador toca pela manhã. Ai que sono!

Meu corpo recusa-se a obedecer ao som rotineiro,

Mas minha mente me obriga a sair da cama,

Num ritual quase mecânico que se repete ad infinitum.

Até quando?

Vivo uma rotina imposta pela sociedade capitalista

Que me obriga a ganhar o pão não só com o suor do meu rosto,

Mas com a abdicação dos pequenos prazeres que me identificam como ser humano. Dormir um pouco mais, passear com a família, sair com os amigos.

Cadê meu tempo?

Sou um escravo moderno.

O tempo é minha chibata, arde em meu corpo cansado de cumprir metas,

De cronometrar horários, de viver no limiar da existência, sem de fato existir.

Quem inventou a palavra liberdade, não lhe atribuiu o real significado,

Pois, em seu sentido dicionarizado, ela realmente não existe.

Sou iludido por essa ideia e docilmente me deixo iludir.

Isso me compraz!

Sou a massa que move a máquina do ter, perdendo minha essência de ser.

É... se não adoto o sistema, torno-me obsoleto, vivo à margem.

De toda forma sou marginal, pois boicoto a mim mesmo,

E subverto meus ideais para ser aceito.

Acorda! E o que minha mente diz, mas meu corpo já não obedece.

Adestraram-me!

Poema publicado no livro Não diga que a poesia está perdida (2016)

Cleusa Piovesan

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Cleusa Piovesan
Enviado por Cleusa Piovesan em 06/08/2020
Código do texto: T7027634
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