O outro lado do cotidiano

Em todo poema aprendiz

você pode inteirar sem bater.

É difícil achar o caimento perfeito da asa;

subo noite e desço estrela,

subo dia e desço sol,

às vezes a pressa da imaginação nos joga logo para o fim do mês.

E eu faço verso que nem cismando.

Aí um arquivista amigo meu

-e do Belchior-

me fez entender um bocado de tudo que eu tinha certeza que não ia ser.

Um poema delicado demais nem sente a língua,

é verso temporão, não quero;

também não quero o verso rebocado: Tupi derramando de Europa,

escambo que se aperta de navio a navio;

como quem com os bolsos cheios de deboche

recita aos porcos a orelha do livro.

Há que se ter originalidade! apesar de Rimbaud, Baudelaire, Poe, Ezra e Maiakovski.

Entre um silêncio cercado de um poema e o breve silêncio das estrelas há um pau-de-arara barulhento e prenhe de ferrugem que se insinua ao sertão e nos joga nos olhos -filho da puta- a areia que ficou no vento.

Há que se ver a realidade! apesar de Cecília, Bilac, Vinícius, Pessoa e Verlaine.

A poesia protege o facão da mão do homem.

E do lado de lá da tarrafa o peixe prepara o rio,

o poste traça um fio de andorinha por cima das nossas cabeças

e o poeta mistura a luz da lamparina com a friagem,

feito bola matada no peito do pé.

E tudo que não tinha espaço no cartaz

ele põe do outro lado do cotidiano;

eu chamo a isso poesia.