A cura apenas para o fim do mundo
Para Robert Smith.
Gosto das coisas que começam e acabam
do estrago e do escândalo
do estrondo que antecede a hecatombe
e da morte lenta como perfume de sândalo.
Oh gosto também da pobreza em minha rima
e do verso que acaba sem dizer nada.
Gosto das coisas que começam e acabam.
Das estrelas que acendem e apagam,
da chama bruxuleante da vela
como a da minha vida que sou grato
por não saber que vento virá ceifá-la.
Gosto das coisas que começam e acabam
pois o fim põe a possibilidade de glória
no destino mais ordinário
põe um riso leve e mais intenso que o sol
à boca de qualquer vidinha,
a mediocridade já não junta lama suficiente
para atolar e deter seus pés
e sob a adoração das luzes mais castas
você pode ser um raio azul
no seu mundinho de perfídia e insistência.
Gosto das coisas que começam e acabam
e de seu cabimento na circunstância
de uma vida. Isto já valeria o prêmio
além dos prêmios, o fechar das cortinas
ao final do espetáculo.
Sim, sim, eu gosto mesmo das coisas
que começam a acabam.
As coisas verazes e boas não podem
(nem devem) durar para sempre.
Meu Deus, o que a Eternidade
indiferente Deusa Tutelar
dos Desertos Abertos,
faria com tanta existência em seu quintal?
Meu Deus, quem quer ficar aqui
para além das sementes?