A morena e a borboleta
Estava eu a andar sem rumo,
Pensando numa forma de por a vida a prumo.
Foi quando a vi passar na minha calçada,
E não mais consegui pensar em nada.
Eu, que andava todo cismado,
Atormentado, com tanto pensamento embaralhado,
Já nem mais lembrava o que é que me amolava,
O que por tantas noites meu sono tirava.
Que descomunal beleza carregas!
Foi te ver e foram embora todas aquelas trevas.
Tiraste-me um peso, desanuviou minha alma,
De súbito, me trouxestes calma.
Ela andava em reta, ereta,
Fitando a linha que separa o céu da terra.
Não desviou o olhar enquanto me passava,
Nem percebeu que eu a admirava.
Com seus cabelos negros como a noite mais densa,
Afastou-se, sem diminuir o passo
Fez pouco de mim e da minha querença.
Enquanto me fitava a borboleta negra tatuada no seu braço.
Cada suspiro meu ela ignorava
Enquanto o rastro do seu perfume eu tragava.
Tentava eu absorver-lhe a essência,
E de mim ela nem tomou ciência.
Nem seu nome eu perguntei,
Nem um ‘bom dia’ eu ousei.
Só agradeci pelo perfume,
Sem ter minha voz qualquer volume.
Vá-te, então, escultural morena!
Nega-me o sorriso, nem mesmo me acena,
Já me destes o que eu mais queria,
Que era livrar-me dessa minha desarmonia.