Escolho

Escolho

olhar para cima e ver a chuva.

Ver os pingos nascidos do nada

crescerem a caminho dos meus olhos

até me atingirem a pele

numa mistura tridimensional

de imagem insólita,

som pressentido

e toque disseminado, frio.

Escolho

não lhe fugir porque molha,

não procurar abrigo,

não evadir a carícia

a que nunca me dou,

não temer consequências

nem incómodos.

Escolho

só retomar o caminho depois,

saturados os sentidos,

e inebriada a alma

dos prazeres simples, e

do instante esculpido

para um sempre

feito dos amanhãs que houver.

Escolho

rever-me só depois,

de dentro, ascendente e leve,

sentindo as forças voltarem

e retomarem-me a vontade,

a poesia voltando a tomar posse,

as mãos reiniciando velhos gestos

e o espírito abrindo-se

ao caminho errático

das outras formas de ver o mundo.

Escolho

os anos sem idade

e as horas como sorrisos alegres

entre pensamentos.

Escolho-me, apenas,

como se pudesse não ser assim.

Jan 2020