O Poço.

Eu penso

De lá do fundo

de um poço do meu passado

Me lembro com algum desgosto

De um dia ter sido o bom moço

Pra sempre um rosto sem nome

Velha amiga que vem pra ajudar

Plantar e colher o trigo

A mais antiga se chama fome

Lembranças sem cabimento

Das recordações vividas

Não a sabem nenhum momento

Não desta vida

Tento guardar no esquecimento

Mas elas não cabem nem lá

Noite amiga

Tenha cuidado com suas palavras

É por elas que você será lembrada

Tudo mais não vale nada

Nem será mudado ou emudecido

Não se furte do tempo que leva

O tempo é curto e chega de leve e leva o todo

Numa tarde de ventania

O desabrigo vem

E a gente aceita, precisa aceitar

A antiga cara do espelho

Não mora mais lá

E se isso era tudo

Agora, neste momento, nada mais se ajeita

Há duas coisas na vida que não se pode evitar

A primeira é o pensamento

E a outra é quem te diga o que pensar

Revendo essa quase vida

De alguma maneira eu percebo

Desde sempre, a historia inteira

Estava escrita

Quando a gente chega ao mundo

É pela vida

Mas não dá pra viver por ela

É preciso razão

Tenho estado neste triste mundo

Onde, tudo que de raro existe

Não chega a ser tão profundo

Quanto o poço raso do começo

Nada além de águas passadas

Eis o preço dessa sede insaciada

Que precede à própria vida.

Edson Ricardo Paiva.