Se devo estar onde estou
Tive um dia daqueles.
Peguei o ônibus de volta para casa
e não estava lotado, nunca está lotado
apesar do horário.
Poderia lotá-lo só com minha alma,
pensei nisso e ri o mais grotesco riso
de cansaço e desistência.
Aconteceu algo
estranho, mais estranho que todas
as outras estranhezas:
estava tão concentrado
na audição de “place to be”
que cheguei à dor em todos
os ossos do corpo,
(com exceção da caixa craniana)
e passei da minha parada
e tive que voltar todo o caminho.
Desci logo depois do Brasão
e pensei: dê o melhor de si puta velha,
eu aguento.
Um rato poderia jogar futebol
com minhas ideias e se dar muito bem
em compra de ações, apostas em corridas
de cavalos e rinhas de galo
ou chorar as pitangas de um amor fracassado
com meu lenço de seda chinesa
sob as patas, quem se importaria?
Meu caminho de volta era longo e estreito,
sabe Deus porque tinha risos espipocados
pelos bolsos e um agasalho amarrado à cintura.
Eu parecia estar bem, aquele era só o 2º round
e eu repeti: dê o melhor de si puta velha,
eu aguento.
Pensava nas palavras de Drake ditas num idioma
ao qual tento me familiarizar, pensava, pensava
e assim matava os burros
ao redor de minha alma atormentada
como o rato apostador.
Andava, andava e a música assolava
meus sentimentos febris
pensava se nasci mesmo para estar
onde estou
se ocupo meu lugar ou o alheio,
saudade de casa e promessa de não-retorno
saudade de mãe e abandono de pai
saudade da vida que me acenava galopante
em cavalo de fogo na direção contrária
a meus passos
então parei no posta Pérola
e comprei duas cervejas,
abri a primeira e disse:
devagar, devagar, alivie,
puta velha,
pode abrir a contagem
estou quase nocauteado.