A tragédia do palhaço

Ele dominava o palco

Certo de que era o melhor

O mais belo

O mais talentoso

O mais engraçado

Feliz, orgulhoso

Cheio de si

Protagonista de sua história

Mestre de sua vida

Os coadjuvantes

Circulavam ao seu redor

Rindo de suas piadas

Rendendo-lhe amizades

E homenagens

A plateia sorria, embevecida

E ele seguia a vida, aliás

A peça

Que representava para si

e para os outros

Um dia, as luzes do teatro

Subitamente se acenderam

E do palco ele viu

como nunca vira antes

Que a plateia estava vazia

O som dos risos e aplausos?

Fruto da imaginação

(Ou da loucura?)

E os coadjuvantes

Na verdade

Oh! Não é possível!

Não atuavam com ele!

Cada um encenava sua própria vida

Ou melhor, sua peça

Todos centrados nas ilusões

Que criavam para si

Não havia plateia

Não havia sucesso

Todos estavam sós

se julgavam tão bons

Felizes, realizados

Vivendo nos personagens

Que inventaram

E pior: vivendo sozinhos

Ninguém estava olhando.

O palhaço percebeu-se

Caricatuta de si mesmo

Lentamente, entre soluços

Despiu o figurino, tirou a máscara

Caminhou pelo teatro vazio

Em busca da luz

A luz do dia

Que traria dor e verdade

Enquanto dentro do teatro das representações

Outros palhaços

ou talvez apenas pessoas (como eu e você)

Continuavam a encenar suas grandes ilusões.