Ainda bicho, meio homem, quase mulher

Que venha a mim essa mulher negra

Com sua história

Quando a fala silabada

Indicava, tímida, a intuição

Do vir a ser:

Meio bicho, meio homem, quase mulher...

Que venha soberana, essa mulher

Mãe original,

A dizer com seus fósseis

O que a história não pode com palavras

E me falar de sua arte.

Sua pele queimada, seu cabelo crespo

Seu corpo sem pelos e suas entranhas suadas

Uma relação perfeita nascia ali, argilada

Ainda bicho, meio homem, quase mulher...

Que venha essa mulher

Traçar a pedra, polir a faca

Criar o fogo e dominar a mata:

Ainda bicho, meio homem, quase mulher...

Que venha essa mulher

Balbuciando cânticos de ninar

E no arquejar dos sons, a emoção de ouvir o outro

E se perceber no calor, no olhar, no toque sedutor:

Ainda bicho, meio homem, quase mulher...

Que venha essa mulher

A se erguer, a modelar o corpo

A se locomover em busca de horizontes

E a dominar a natureza, numa paixão intempestiva

Sendo mãe e filha

Ainda bicho, meio homem, quase mulher...

Que venha sempre essa negra mulher

Cultivar a terra, plantar o grão

Fertilizar o solo, engravidar

E nascer junto e juntos salgar a terra

E viver em comunhão

Ainda bicho, meio homem, uma mulher!

Lázaro zachariadhes
Enviado por Lázaro zachariadhes em 15/03/2019
Reeditado em 19/11/2021
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