AO DEUS DAS LARANJAS
As laranjas pediram-me
Como últimos desejos,
Antes da espremedura,
Que eu as lavassem na água fria
Desta que corre na torneira da pia;
Que cortasse com o fio
As cascas somente,
Deixando intactos os centros
E assim poupasse os gomos,
Não decepasse as sementes;
Que fizesse passear os bagos
Por entre as arcadas,
Abençoando-os com saliva,
Ensinando a língua da rua
Para lançá-los, depois, na terra nua.
Agarraram-se me aos dentes
As membranas, os alvéolos,
Julgaram-me tirânico.
Chupei delas o bagaço
Antes de lançá-las no lixo orgânico.