Não sei ler

Tudo some

Tudo evapora

Nada sobra

Nem a sobra

Quando abro um livro

Sou morte instantânea

Sumiço repentino

Sou de mim inquilino

Querendo arrendar a casa

Leio o que vivo

Meus livros não têm capa

Têm pele de ovelha

Não têm páginas

Têm pá e uma cova esfomeada

Que sôfrega engole mais um corpo

Malsofrida esta paragem no intento

De querer atentamente perceber tudo

Mas não reter nada

Do que está escrito

Por não saber amar

Estes livros que não são objectos

Não são cadernos

São rostos didácticos e um manancial divino

Não fosse ignorado

Seria todos nós

Aparências desaparecem

Vejo quem são

Os que se fingem alguém

Quando descortino os manuais

Que cada um de nós é

Aquém morre a falsidade

Mostre a bunda dessa cara

Traga os votos com confiança

Desconfio e sou descrente

Os lobos são carneiros

Minhas histórias não contadas

São narradas com sangue dos partos desfeitos

Na circuncisão das letras

Um parágrafo se nos leram

Um livro que acabou

Dúvidas que ficaram

Folhas que se arrancaram por si

Tudo sobra

Tudo fica

Quando eu não sei ler.

Widralino
Enviado por Widralino em 06/03/2018
Código do texto: T6271918
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