SINAL DE MISERICÓRDIA
Às vezes o mundo requer mais do que aquilo que aparentemente temos,
E olhamos para o nada buscando pelo tudo que em teoria precisamos,
O horizonte parece só um papel em branco esperando alguns rabiscos,
Enquanto os rabiscos se tatuam em nossa pela, marcas de nossas lutas.
É nesse coração que se diminui ao tamanho de uma ervilha,
Que se prende sensações demasiadamente superiores,
E tudo explode sem sair do lugar, sem sujar as paredes já vermelhas e molhadas,
Somos juízes de nossas escolhas e sequer aprendemos a julgar.
Porque tudo é mera suposição, quem nos dirá o caminho?
Somos senhores das escolhas acertadas, e das erradas somos réus revéis, alma aprisionada,
E o vento nos empurra como nuvens, e quem sabe essa noite só queiramos desaguar a chuva,
Tentamos encontrar outro culpado e crucificar, mas já estamos pregados na velha cruz.
E o que importa os sonhos para alguém que esta noite só precisa respirar?
O universo libertou seus tempos austeros, para afogar os filhos do ontem, e eles somos nós,
Eis que tentamos o tempo todo alcançar a glória,
Mas em troca recebemos um pão seco e um copo d’água, como sinal de misericórdia.
Enquanto escassas mãos te puxam à superfície, corpos se jogam em cima de ti para afundar,
Onde a esperança virou anciã vilã, segurando o amanhã com suas asas quebradas,
Se distanciando de nós, mas não podemos perder a nós mesmos,
Enquanto o mundo esquece os seus perdidos.
Para que não seja tarde demais e se furte de nós o último suspiro,
Em uma derradeira tentativa de costurar o corpo já retalhado,
E damos mais um passo, apenas por revolução,
Contrariando o fluxo e a contramão.
Alguns seguirão por uma promessa, outros pela frágil expectativa,
Alguns far-se-ão cegos para guardar a convicção,
E os que tiverem um pouco mais de sorte,
Seguirão, pois ainda encontram seus oásis no consolo de um amor.