CAPTURA
Dando vulto aquilo que vejo
Caminho deixando por todos os lugares
Restos
Rostos
Rastros peculiares.
No caminhar que vislumbro
Objetos inanimados e vulgares
(Portas
Janelas
Quadros
Camisas
Cadeiras
Carros)
Lhes dou vida ao mira-los.
Mas se fito a mim mesmo
(Reflexo prismático)
Projetado no espelho
Me apago
Me abismo.
E logo penso
Seria então oposto disso?
O completo inverso do que a priori
Por mim capturado em verso
For-se-ia ou fora dito?
O que contemplo
Não ilumino
Ao contrário
O que no olhar capturo
Também me fita
E é o que me faz vivo!
Pois o homem (matéria e
mistério)
Só pode se ver de dentro
Do ponto de vista
Em que o mundo é labirínticamente sério.
E o olhar que o desvenda
E o aviva
Só tem efeito sob quem
O recebe
Não sob quem a si mesmo o aplica.
Não se vê o mundo através do espelho
Somente seu espectro gêmeo
Imune ao feitiço
Que opera a atenção cedida.
Reparo que nem sempre envaidece
Ou intimida
Mas a vida
Só posso senti-la
Cinti-lar na sensação efêmera consciente
De que é viva
Quando um olhar inédito a ilumina.
E sabendo que o sentido de tudo é o outro
Assim se inicia um fogo cruzado
E misto
De olhar
E neste mesmo gesto
Ser visto.