ONDE?
Onde o homem aprendeu a imitar o gelo,
queimar a mão suave de quem o toca,
a ser a carta com o indefectível selo,
a espiar o mar, a mais solitária roca?
Onde o homem desenvolveu o cinismo,
junto a ele a aridez de seus pensamentos,
em que lareira queimou seu lirismo,
como pôs o aqui fora todo para dentro?
Talvez saibam os sábios que sabem pensar,
os que escutam o rumor da folhagem,
os que viajam sem sair do lugar,
os que temem, mais que o medo,
a coragem de tudo mudar...
Onde o homem conheceu o desprezo vil
que aplica em seus negócios, sem recear,
que derrama mil homens amarrados em seu funil,
que incendeia cabanas para o ouro buscar?
Onde o homem aprendeu a mentir com tanta verve
a quem dele se aproxima, seja de noite ou no claro dia,
o que o faz ser demoníaco com quem dele se serve,
a recitar a mais estranha indecorosa e maligna poesia?
Talvez saibam as crianças que olham com sinceridade,
os pequenos frutos das relações humanas, deterioradas,
saibam os minúsculos seres que passeiam na muda paisagem,
os sons que cantam a vida com sua preciosa voz calada...