EM BUSCA DO VELOCINO DE OURO CANTO PRIMEIRO – TRAIÇÃO EM FAMÍLIA I
EM BUSCA DO VELOCINO DE OURO
CANTO PRIMEIRO – TRAIÇÃO EM FAMÍLIA
I
Eu, o Rei Juclito de Alembete,
Montado no meu Pégasus Rompinete,
Deixando nas estrelas -- o meu trono,
Encontro-me agora,
Frente à um drama familiar
De grandes proporções,
Do qual, olho em torno, e num cantinho,
Atormentado, sozinho,
Cabisbaixo, entregue ao abandono --
Vejo Esão, outrora
Alegre, sempre contente,
Toda vida
Prosa e sorridente,
A mão de amigo ao visitante estendida,
Hoje, macambuzio,
Fronte transida de amargura,
Cujo desfecho da traição,
Lhe será por demais cruel!...
É que, o látego da desventura,
Sob o véu
Da perfidia, virá logo, do próprio mano,
Ainda que meio sangue, o Pélias,
Que tomar-lhe-á para si, o trono...!
Sabia que durante
A expedição dos Argonautas,
Pélias o matar tramava,
Então Esão,
Para não morrer
Pela mão do próprio irmão,
Pediu para suicidar,
Coisa que o faria,
Bebendo o sangue do touro sacrificado.
II
Ante tal quadro, que se me descortinava,
Minha mente, das cinzas do passado,
Retrocede a uma cena que teima em vir à tona
Qual um filme que se repete,
No quadrante de quase duas décadas,
Cujo interlúdio abriu-se no ano
Das primeiras primaveras de Jasão,
Época em que, pressentindo o perigo
Que a existência da criança rondava,
Chamei a mim, a responsabilidade
De incutir na mente de Esão
A ideia salutar
De fazer Jasão,
Seu filho, ser na Tessália exilado,
Fugindo do mau destino,
E do tio desalmado...
E, sem deter-me em minha
Ferrenha determinação,
Ao meu amigo centauro,
Quíron, com a anuência do pai choroso,
Esão, deixei a guarda do menino,
Com o objetivo que esse o preparasse,
Com parcimônia, o educasse,
E enfim, com o zelo que lhe era peculiar,
O doutrinasse
Na lida
Da ciência, e na defesa da própria vida!
III
Retornei à Tessália,
Onde era chegada a hora
Do acerto de contas,
A recobrada do trono
Que por maracutaia,
Fora usurpado...
Então, apeando do meu Pégasus ,
Cruzei as cercanias da cidade,
E com grata surpresa --
Vi assomar à minha frente,
Face iluminada de alegria,
Sorriso aberto, bem contente,
Em efusiva saudação --
Quíron, o Mestre-Centauro,
Que além preceptor,
Estava também de sentinela,
E ao canto, deitado
À sombra de uma bela laranjeira,
Numa rede erguida,
Seu discípulo -- Jasão,
Ao seu cuidado,
Mente ocupada por mil conjecturas,
No augusto dia em que completava
A maior idade,
E a suave brisa que suavemente
Na tarde amena soprava,
Beijando e balançando
As folhas da jasmineira,
Num sorriso que perfuma e que inebria,
A Jasão encorajava:
-- Filho de Esão, é hoje o dia,
Em que um novo sol, para ti, brilha,
Trazendo-lhe da esperança –
Alvissareira trilha, --
Um mundo de venturas,
E esse mesmo sol benfazejo,
Munido, vem, com a clava da justiça
A conclamá-lo,
A reparar a grande injustiça,
Da qual, fora vítima,
Reclamando o seu trono,
Que fora por Pélias usurpado!
De bom grado,
Agradeci à amiga brisa!
Sempre fora esse o desejo
Que durante anos,
Em meu peito, acalentava:
Fazer com que Jasão
Reclamasse o trono
Que lhe fora afanado...!
Nessa minha ideia acalentada,
Dei trato à bola,
Deixando incumbido ao destino --
Que fizesse seu trabalho!...
E sem temer aos vendavais da sorte,
Aos deuses olimpianos,
Mais uma vez,
Minha coragem se revela...!
É que, sem mais delongas,
Eu, o Guerreiro Invencível,
Reúno os semideuses
E os heróis, em um só quadrante,
E do extenso horizonte,
Vejo vir chegando,
Os três deuses soberanos:
Zeus, que vem com a esposa Hera,
Poseidon e Hades,
Após terem deixado os tronos –
Para associarem-se a mim,
Na jornada que enfim,
Mais uma vez, me aventuro:
Ajudar a Jasão,
Na sua missão
Quase impossível --
O resgate do seu trono.
III
A história que estou narrando,
É um drama cruel,
Cujo desenlace da tragédia
É bem maior, é mais medonho:
Do lado, a espiar a medo,
Vivendo seu pior pesadelo,
O delírio de um mau sonho,
Vejo Pélias que treme,
Respiração arquejante,
Passos trôpegos, vacilantes,
A preparar-se para a fuga,
Cujo rosto pálido, combalido, enxuga,
Suor qual bica caindo,
Mente rápida e ansiosamente trabalhando,
Mil artifícios arquitetando,
E, sem saída,
Para o dilema em que se encontra na vida,
Desesperadamente, uma ideia cínica,
Abjeta, escaramuça,
Para livrar-se, na ótica
Doentia dele -- da presença intrusa
Do sobrinho Jasão
Que, semblante enfurecido,
Olhos carregados de cólera,
Voz trovejante, --
Reclama o que por direito,
Sempre lhe pertenceu --
O trono que lhe fora usurpado.
Não queria estar ali, de mediador,
E nem interpor-me na liça,
Mas na minha face, o clamor
Que abrasava meu peito,
E me fazia de raiva fremir
Com a deslealdade,
A insidiosa ação peleana,
Impulsiona-me a buscar justiça,
Movido pelo meu senso
De amizade e lealdade,
Ditados por minha consciência,
Que a um amigo, nunca abandona,
Até porque, de Pélias, escutei pasmado...
Cuja sem-vergonhice é tamanha,
A proposta indecente, tacanha:
-- Jasão, sei que é justo... justíssimo,
A coroa de reinado,
A ti, restituir!
E como ainda és muito jovem,
Não tens experiência suficiente
Portanto, pra reinar,
O que propor-te-ei,
É um verdadeiro tesouro!...
E a ti somente,
Por seres meu sobrinho querido,
Vo-lo concederei!...
Vai! Traz-me o Velo de Ouro,
Que o trono é todo teu!
Assisti a esse despautério, revoltado,
E de pronto, bradei:
-- Pélias, seu traidor, seu desnaturado!
Monstro, a missão que propõe a Jasão,
É deveras, arriscada.
Nessa infame jornada,
Da qual escamoteias a vida
Do teu próprio sobrinho,
Saibas que ele não está sozinho:
Eu, Juclino, a Jasão associado,
Sem perda de tempo, agregaremos
A essa afronta,
A assa infâmia a que com cinismo
Chamas de verdadeiro tesouro,
Alguns heróis de monta.
E por toda Grécia, arregimentaremos
Valorosos heróis e semideuses de ponta,
Cuja escolha não recairá
Apenas na coragem
E nos poderes que cada um possuir,
Levaremos em conta –
A fidelidade,
A honorabilidade, a confiabilidade,
O desprendimento e disposição
Para de corpo e alma,
Integrarem-se à missão quase impossível
a que no disporemos,
Em busca do Velocino de Ouro!
CANTO SEGUNDO – O RECRUTAMENTO
DE SEMIDEUSES E JOVENS HERÓIS
I
Eu, Huclino de Alembete, Invencível Atlante,
Vestido em esplendor,
Rei das táticas beligerantes,
em mil batalhas -- vencedor,
Trabalhei com paciência, com extrema determinação,
E, num clima de amenidades,
Tracei meus planos
De reconquista do reinado de Jasão!...
E por toda Grécia,
(eu que era arauto importante na missão),
Depois de uma procura incessante,
Consegui, com grata surpresa, –
A adesão de uma boa quantidade
De jovens à honrosa empresa –
Uns cinquenta heróis
De renome e qualidade,
Filhos ilustres da mais alta estirpe
De deuses olimpianos,
Que vieram dispostos a agregar
Força à nossa ariscada missão!
Todos eles, heróis de grande renome e valor.
A cada um – na expedição –
Determinei desempenhar
Uma específica função,
Conforme suas habilidades.
Eu mesmo, para enfrentar
Os perigos do mar desconhecido – deliberei
Que construído fosse -- um navio possante,
De dimensão gigante,
Que suportasse a ira do oceano!...
A Argos, filho de Frixo, a incumbência dei,
Da construção da nau,
A qual, em sua homenagem,
O colosso batizei –
Com o nome de Argo!
II
Outros semideuses
Das estirpes mais avançadas,
E heróis de muita monta,
Cônscios que era uma afronta,
Não acederem ao meu convite,
De bom alvitre,
Associam-se à minha arrojada investida!...
E do litoral do Egeu,
Demando as presenças
Dos dois intrépidos
Irmãos gêmeos -- Pólux e Castor,
Que logo se fazem presentes!...
E a eles, que eram filhos de Leda e Zeus,
Os convoquei, com a missão
De atraírem do pai – o supremo deus
Dos deuses do Olimpo – a proteção
Durante a tempestade
Que a nau iria ser obrigada a enfrentar
Ante os perigos do oceano cruel
E traiçoeiro leviatã marinho!...
Também Orfeu,
Vestido em esplendores,
Ele que era Poeta e médico,
guerreiro e doutor
Dos doutores,
Músico e compositor
De grande talento,
Cujo vento
Emocionava-se com sua voz maviosa,
Melodia preciosa
Que a todos fascinava,
Inclusive, até aos deuses
Que lhes deu o dom de cantar,
Teve por tal mister ,
A tarefa facilitada
De no mar revolto -- abrir caminho,”
Cadenciando, portanto,
Dos remadores – o trabalho
“E de, principalmente, sobrepujar
Com sua voz, das sereias – o canto
Que seduzia” ate
Os mais experimentados nautas,
Fazendo-os perder o rumo
Frente ao abismo de gigantescas ondas,
Monstros marinhos
e horrendas criaturas
Que habitavam o mar profundo!...
Também pudera,
O talento que dele – sobressaia,
E a associação de virtudes
Impares que possuía,
Em razão de ser filho de pais tão ilustres:
Apolo e a musa Calíope,
Sendo dos poetas --, o melhor
Que no mundo já viveu,
Honra-me deveras,
Com a sua presença à nossa expedição.
Hércules e outros heróis de alta estirpe,
Agrupam-se -- armaduras reluzentes,
Cordoalha em punho, gigantesca
Pedra como amarras,
Que logo ao convés, são alçadas
Enquanto o tempo urge,
E a tempestade não amaina,
E, incontinenti,
Com o fito de elevar o moral
Da tripulação,
Dou ênfase à minha fala:
-- Queridos Argonautas,
Imperativo se faz,
Partir sem mais tardança,
Testando de cada um – a temperança,
Não se dando conta do temor,
Ante o furor
Do oceano que ruge,
Sacudindo as vagas!...
A nossa nave, que é tenaz,
A qualquer tormenta,
Galhardamente, enfrenta!
Como se Poseidon, deus do mar,
De repente, ouvisse minha prece,
A tempestade enfim, seu furor, arrefece...!
E o Argo zarpa, singrando as águas marinhas,
Agora, apascentadas, em busca do Velo!
CANTO TERCEIRO – TOMENTA EM ALTO MAR
I
Mais uma vez eu, Huclino de Alembete,
Rei de Estrelinário,
Montado em meu Pégasus Rompinete,
Vou trotando pelos confins do mundo,
Em mais uma jornada à qual me aventuro!...
E da Grécia Mitológica,
Fito o mar que quebra lá na praia,
Quando a tarde no horizonte já desmaia,
E a Embarcação Fantástica aponta a proa!...
É o Argo, que assoma à minha frente,
Cujos Argonautas, a bordo, ousada
E destemidamente,
Desafiam o desconhecido
Mar bravio!...
E no Fabuloso Navio,
Debruço-me no “tombadilho,”
Olhos fitos no firmamento,
Cujo brilho,
É como o céu vermelho em brasas!...
E no mar, que compunha
Um panorama apavorante,
Sou testemunha --
Do furor do vento
Que ruge, sacudindo as vagas,
E da tormenta – gemem as procelas,
E a Estupenda Nave
Eriçando as velas,
Envolta em gigantescas ondas
Que quebram no “pélago profundo”,
Está a adernar!...
E os argonautas –
Indiferentes à desdita
Que lhes ameaça a vida,
Qual augúrio de um maléficio futuro,
Ante os perigos da tempestade
Que no oceano, a tudo arregaça,
Rugindo e amedrontando
Até o mais experimentado dos nautas,
Dedilham chorosos, as cordas da lira,
Num concerto de sonatas
Ao luar,
Em um canto de saudade que entoam!...
E a tripulação delira...
Sonhando com os ardentes beijos da amada...
Mas de repente, muda-se o cenário,
E o que por mim é visto –
São outras paisagens,
E outras são as personagens
Que entram em cena,
E estupefato, assisto:
Da densa neblina,
Em toda sua majestade,
Com uma beleza agressiva
E ao mesmo tempo suave,
Vir surgindo a deusa Atena,
E um vulto que no Argo -- na amurada --
Se inclina...!
É Jasão, que saúda e agradece
À deusa da guerra,
Pela recebida graça --
A embarcação,
a qual fora dela a ajuda substancial
Para a sua construção!...
No vai e vem da nau,
ao balançar das ondas,
Fito uma vez mais, o mar,
Cuja tormenta não arrefece
Em sua ira,
Como se fora Poseidon, comandando
A borrasca qual diluvio!...
E os Argonautas -- passiva
E corajosamente,
Continuam chorosos em sua lira,
Contemplando o mar em sua fúria,
Pensando nas companheiras
Que ficaram lá na terra...!
CANTO QUARTO – OS OBSTÁCULOS
ENFRENTADOS PELA EXPEDIÇÃO
I
Eu, Huclino,
Comandante em Chefe da Expedição,
Secundado pelos Argonautas,
Que apoio emprestavam
À arriscada missão --
A busca do Velocino de Ouro,
Do oceano – contemplávamos
A imensidão!...
E o céu, que da tarde se despedia,
Estendendo sobre a terra
O manto negro do ocaso,
Semelhando a uma imensa mortalha
Sobre o mar que bramia,
E incessantemente trabalhava...
Sacudindo as vagas,
Num vai e vem de ondas gigantescas
Que incansavelmente quebravam
“No pélago profundo”,
Era testemunha
Do drama de contorno inesperado para nós
Que, do abismo em tormento atroz,
Mensurávamos pasmos de aflição,
A extensão
Dos problemas que se nos acometia!...
Que rumo tomarmos, em meio à imensidade?
Que trajeto seguir, rumo ao desconhecido?
Que plano, a ser concebido,
Ante a barafunda da imensidão do oceano?
Estávamos, pois, na mão do acaso.
Mas de repente, o milagre veio, incrível,
Donde menos se esperava!...
E o capricho do destino,
Deu-me uma lição de moral inesquecível,
Fazendo com que nos socorresse,
Logo duas pessoas as quais,
A priori, eu havia negado
Adesão à nossa causa! Ídmon e Anfiarau –
Os quais me refiro,
Excelentes adivinhos,
Que com seus dons de previdência do futuro,
Guiaram-nos na tempestade!
II
Outros heróis e semideuses portentos,
Cujos nomes -- na lousa da história
Assinalar vale apena,
Também a nós, se associaram.
Dos quais,
Perfilou-se, à minha frente,
Sorriso farto e bem contente,
O fabuloso discípulo de Atena,
Tifis, expert na arte da navegação,
O qual me participou:
-- Mestre Hucklino,
A tão sublime causa, me inclino,
Aceita-me, pois, na expedição.
-- Tifis, farei muito mais:
O designo piloto da embarcação.
Todavia, não poderia contar
Com as asas nefastas do infortúnio
Que sobre nós, se abateu:
É que, nosso hábil timoneiro,
Veio a vida perder
Quando das costas
Da Bitínia, nos aproximávamos!...
(O desfecho da morte dele, narrarei depois)...
Mas como dinâmica é a vida,
Não nos dava tempo para chorarmos
A perda inestimável.
Imperativo se fazia,
Proceder logo a substituição!
Havia, na expedição,
Um jovem inteligente,
De raciocínio rápido e diligente,
De prestigio e grande valor,
De conhecimento incontestável
Na arte da navegação,
Filho de Posidão,
Ergino, o qual nomeei novo piloto
Da Fantástica Embarcação!
Mas a historia não me fazia justiça,
E olvidava, não sei se por preguiça,
Ou desleixo dos historiadores,
Algo tão importante,
Que jamais, poderia passar despercebido!...
Fui eu, Hucklino, e não Jasão,
O Chefe e Comandante da Expedição
a qual, alguns obstáculos advieram.
Todos, com muito denodo
E extrema determinação,
Logramos sobrepujar!...
Logo de imediato, um -- nos precedeu.
Fato acontecido,
Quando da nossa primeira escala
Na ilha de Lemnos somente
Habitada por mulheres...
Para tamanha surpresa que tivemos,
Assoma à nossa frente, formoso vulto,
Após na ilha aportarmos.
Era Afrodite, que de raiva estremecia,
Ante a ofensa sofrida –
O insulto de míseras mortais
Atreverem-se, a não lhes prestar culto!
Como paga ao capital
Crime de desrespeito
À sua deidade,
A deusa da beleza e do amor,
Um terrível castigo impôs às atrevidas,
Punindo-as com um cheiro insuportável,
Daqueles que fazia
Com que seus maridos a rejeitassem,
E a uma humilhação tamanha a sujeitassem
Partindo à procura de prazeres sexuais
Nas camas das escravas, lá na Trácia.
Movidas pelo ódio e pelo despeito,
As lemnianas,l seus esposos assassinaram!...
E na ilha instalaram
Uma república apenas de mulheres.
Com a nossa chegada,
Tal cenário transmudou-se.
A líder feminina, Patracia,
Ao pousar-me os olhos,
Deslumbrada, queda-se, ante meu
Porte majestoso,
Cuja beleza turvava
À de Apolo, o mais belo dos deuses,
Por mim apaixonou-se.
Dei-lhe uma penca de filhos!...
E seguindo os mesmos trilhos,
Os Argonautas povoaram a ilha
Com belíssimos rebentos!
III
Na ilha de Samotrácia,
Cuja segunda escala, empreendemos,
Alguns problemas tivemos!...
Porem, o que mais nos atormentava,
E mais e mais nossa preocupação aumentava,
Eram os constantes naufrágios.
Que fazer, ante a força da natureza,
Tão caprichosa?
Até mesmo eu, Huclino,
que dentre tantos atributos,
Também era versado
nos Mistérios dos Cabiros,
Que fazer? – me perguntava...
Quando de repente,
Veio-me à mente, uma ideia esperançosa:
-- Sim, a situação não é tão periclitante –
A mim, eles devem alguns favores.
Chegada é a hora, de colher os bons frutos
Das boas ações que pratiquei,
Frente aos Gênios bem Feitores.
Passei do pensamento, à ação,
Pois meus atos não eram esbirros
Da má educação,
E com lisura, com delicadeza,
Aos gênios proteção roguei!
Coisa que eles gentilmente atenderam!
Enfim, livres dos naufrágios, pudemos
Partir em paz.
Nossa estada era agora, no Helesponto, mar
Que serviu de túmulo à jovem Heles,
Que acalentava no peito tantos
Sonhos, tantas ilusões desenfreadas,
Mas por obra do mau destino,
Nas profundezas marinhas, agora jaz!
Não tivemos tempo, para plantearmos da bela --
A triste partida, para as plagas
sem fim, do outro mundo,
Porque “navegar é preciso, viver não é preciso”!
Assim, como Fernando Pessoa, no seu célebre poema
Ufanou a importância de navegar, agimos.
Numa tarde de sombra no horizonte,
Na península da Propôntida, encoramos.
Não sabíamos qual a recepção que nos aguardava,
“ No país dos doliones, povo governado
Pelo rei Cízico”,onde aportamos...
Mas grata foi a surpresa que tivemos:
Fomos recebidos,
com festas e honrarias de Estado.
Neste gostoso folguedo, ladeado por belas mulheres,
O bom vinho e iguaria dos deuses,
A noite se fez, sem que percebêssemos.
Era triste, ter que partirmos rapidamente.
Agradecemos às deferências recebidas.
Os Argonautas e eu, o intrépido Hucklino,
Saudosos, partimos, rumo à Mísia.
Porém, mais uma vez, a força da natureza,
Impunha-nos, um terrível golpe:
Em meio à tempestade, que de repente
Surpreende-nos, só restava uma alternativa,
Empreendermos o retorno à península.
A nossa chegada intempestiva,
Com o negror da noite imperando,
Foi a causa de tantos transtornos e tanta dor!...
Os doliones não nos reconheceram.
E, pensando estarem frente a invasores,
Atacaram-nos, brava e impiedosamente!
E o campo de batalha, banhou-se
Em um mar de sangue
Que por toda noite estendeu-se.
Ao amanhecer,
O triste e lamentável engano, percebi:
Dentre os mortos, jazia o rei Cízico.
Chorei de remorso. Até hoje choro.
Não tive coragem, de olhar o cadáver
Do amigo que há pouco tempo conheci,
E em pouco tempo perdi.
A Jasão, pedi que o sepultasse,
Que o cultuasse
Assim, como bem o merecia –
Como um rei digno e integro,
Justo e benevolente,
Que não merecia o sortilégio
De uma inesperada morte
Pela mão de quem ele os recebeu,
Como um pai que recebe o filho.
Refiro-me em prantos,
Aos meus pupilos – os Argonautas!
IV
O drama nosso aumentava, em cada incursão
Que empreendíamos.
Meus jovens companheiros Argonautas
Estavam cansados,
Por demais estafados
Ante a jornada
Intensa que imprimíamos.
E nada de chegarmos ao Velocino de Ouro.
Hércules era o que mais reclamava.
Em Mísia ele teve que interromper sua viagem.
Hilas, seu amigo do peito,
Que era bastante forte e tinha muita coragem,
Possuía, porém, grave defeito –
A ingenuidade de não poder vê um belo
Rosto, que logo se encantava,
E de pronto, suas defesas declinava.
Fora ele, Hilas ,” encarregado
De buscar água numa fonte”,
Descuidou-se, porém, ao admirado deparar
Uma visão dos sonhos,
Belíssimas mulheres saídas das águas.
Eram Ninfas que o seduziram,
Capturam-no, e para
As profundezas dos rios o arrastaram.
De Hércules, foi imensa a dor
Ao ficar sabendo da noticia tão ruim.
Injustamente, comigo ralhou:
-- Seu Huklino de Alembete !
Seu aspone do Argo! – gritou.
-- Por que permitiu tamanha atrocidade?
Sabia você, das Ninfas, e mesmo assim,
Hilas à sanha daquelas criaturas,
Aquelas mulheres infernais, o atirou!
Isso é maldade!
Só aconteceu, porém,
Em razão de eu ter ao bosque ido
Buscar madeira para refazer meu remo partido.
Polifemo que calado
assistia ao desabafo herculiano,
Interveio em meu favor:
-- Mano Hercules, não entra em desatino!
O Comandante em Chefe, Hucklino,
Não tem culpa de nada.
Nos encantos daquelas diabas, qualquer um cai.
Fica calmo, vai!
Ouvi os gritos de Hilas, pedindo socorro.
Vamos logo atendê-lo!
Os dois saíram, varando floresta, riacho e morro,
Adentrando pela noite trevosa.
Lamentei profundamente.
Mas tinha que dar partida ao Argo, que zarpou
Com menos três tripulantes.
A verdade é que nunca mais os vi.
De Polifemo, soube que posteriormente,
Uma cidade ele fundou
Naquelas terras onde estava,
A qual de Cio denominou.
Foi rei ali, por muitos anos.
E para Hércules, que seguiu
Seu rumo de aventuras,
O destino tinha reservado
Muitos e importantes planos.
Dentre os quais, o mais importante:
Os 12 Trabalhos que tinha a realizar!