PREOCUPADO
Queria me preocupar
com algo mais preocupante.
Como nada me perturba,
crio meu próprio pesar:
A curva que foi mal feita,
a casa mal desenhada;
queria estar preocupado
com uma pessoa, amada.
Quisera ter a ventura
de me perder em lamúrias
por um jarro derrubado
sobre um tapete de lã.
Ter a minha paciência
testada por um novato
que deixa na cafeteira
um vazio toda manhã;
queria querer morrer
por uma doce palavra
que foi mal interpretada
e desilusão causou;
ou ser uma desarmada
freira numa escola velha
que preza por cada aluna
que ainda não se apresentou;
talvez perder a cabeça
pelo bilhete tardio,
inabitual, vadio,
com desculpa esfarrapada
de quem chegou arrasada
por não ter tido desculpas
a dar para costureira
(da qual já não se lembrava).
Fico aqui criando caso,
debatendo-me sem causa,
desenrolando um novelo,
alimentando a couraça
e me afastando da paz;
e me deixando levar;
criando a situação
pra poder me preocupar.