ESTRANHOS PARAÍSOS
Notas agudas de uma música tocada ao piano,
Ao fim de uma tarde chuvosa que aguava o veludo das flores,
Afogando a terra, submergindo coração,
Notas agudas de uma caixinha de música,
Onde a bailarina solitariamente dançava,
Ao laço da brisa fria que invadia o quarto pela janela,
Garganta em ardência enquanto os olhos acachoeiravam-se,
No céu um espesso manto branco das nuvens de inverno,
Falsa calmaria da chuva fina que disfarçava os vendavais de seu observador,
Pássaros molhados em seus ninhos, sonhos embebidos em seus lamentos,
A pele refletia opostamente os extremos nas agruras da alma,
Esfriava na carne para queimar nas lembranças,
As batidas do coração diminuíam ao passo que a cólera dos temores aumentava,
Cansado de si mesmo e o que o espelho empoeirado lhe dizia,
Ele adormeceu em sua cama, nos lençóis frios,
Doces desejos, amargos sonhos que se perdiam ao véu das desilusões,
Dormir era a ponte de quem tentava escapar de si mesmo,
Acessando seus estranhos paraísos,
Lugar sem mapa, pátria sem nome,
Enquanto o sono se fazia berço,
Seu mundo girava,
O silêncio enganava sua percepção,
Fazendo crer que a esperança andava na contramão do tempo,
Retrocedia sem malas e descalça.
Mas o inesperado é a benção dos que desistiram de esperar,
É o céu estrelado de quem se trancou em uma caixa escura,
Devolve a luz aos jardins afogados,
Ele, o inesperado, era como o horizonte alaranjando após uma longa noite,
Clareava o olhar de quem não mais queria ver,
E o fazia contemplar além de suas antigas prisões,
Para que os pés descalços pudessem novamente caminhar,
Entre as flores que perfumavam seus estranhos paraísos,
Onde as angustias se ressequiam nos abraços,
De quem ainda tinha sonhos para permitir,
E em seu coração acordes para tocar sua nova melodia,
Melodia dos que esperaram, desesperaram e sobreviveram,
Dos que choraram para sorrir,
Tiveram pesadelos para sonhar,
E foram despertados pelo inesperado,
Abrindo seus olhos ao novo tempo, novamente amar.