ENTRESSONHO
Quando os afagos sinceros queimam a pele,
E os ósculos são recebidos como ofensas;
É sinal que o amor eterno que inda tentas,
Partiu no silêncio que a noite fria expele.
Quando a alma o toque lento, sutil, impele,
A indiferença fugaz já montou residência,
A compreensão cativa despediu a paciência,
Já não é possível que afeto puro se revele.
Se as virtuosas promessas viraram cinzas,
Se a paixão desenfreada impetrou licença,
Não há palavra nem ternura que convença.
É hora de alforriar repulsas vis ranzinzas,
Abrir as portas do coração tolo que temas
Em tornar prisioneiro o sentimento franco.
Nos olhos as lágrimas de angústia, estanco
Para que sejam extintas todas as algemas.
Que se renove o alento que em mim murmura,
Que a meiga saudade se ausente do meu ego,
Pois a esperança que no semblante carrego,
Adormeceu em fantasia, de livre vida futura.
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