É piá ou menina?
Eu estava na rodoviária. Peguei a minha passagem e subi no ônibus. Eu estava cansado, mas teria mais uma rotina a cumprir a noite. Ao me sentar, deparo me com uma mãe e seu filho. Como amo crianças, eu dei apenas um simples sorriso. Ele ficou um tanto interrogado e me devolveu o sorriso. Em seguida, ele pergunta a mãe: "é piá ou menina?".
Tal pergunta me chamou a atenção. Por mais que minha essência entregue a minha alma, vim de uma criança, que geralmente negamos as falas com "é apenas uma criança", me fez refletir sobre a percepção da criança ao conhecer o mundo. Talvez, eles sabiam lidar melhor com as coisas do que nós mesmos, já somos corrompidos.
A mãe, assustada, disse que eu iria ficar com raiva. Eu dei uma risada de felicidade. Sinto-me feliz que alguém me olhe além do corpo. A minha vontade era de responder: "sou o que tu quiseres". Porém, sabendo que o nível de abstração de uma criança está em processo e não conhecendo a mãe, disse que era piá. Mesmo assim, ele não se conformou e ficou a viagem inteira fazendo a mesma pergunta e eu, rindo.
Quando ele chegou no destino final, me despedi com mesmo sorriso que dei assim que entrei. A intriga da criança foi a minha alegria. Voltei acreditando mais que não devo ter vergonha das minha essências. Posso ser quem quiser, pois sei que estou além das tarjas e rótulos. Sou humano e atravesso os mundos. À vida, eu digo: "sou quem quiser; usem o artigo que quiserem em mim: o ou a, mas nunca usem um ou uma, pois eu sou única ou único. Me amo por isso".